Crítica - Amores Materialistas (The Materialists, 2025)

A maior divisão da cinefilia desde Capitão América: Guerra Civil.

Celine Song é uma diretora que fez muito sucesso alguns anos atrás com "Vidas Passadas" (2023), que é verdadeiramente um filmaço, eu trouxe a crítica dele para cá, é belíssimo, emocionante, e não fiquei sozinho nisso, foi indicado para várias premiações naquela época, pegou várias listas de melhores do ano, entrou em duas categorias do Oscar (sendo apenas Melhor Roteiro Original e Melhor Filme) e foi a grande estreia de Celine, ou seja, se ela alcançou o que alcançou com seu primeiro filme, já instigou o público para saber o que ela traria pela frente. Seu primeiro longa não tinha praticamente nenhum recurso, era muito simples, atores desconhecidos, pouca coisa que empolgasse extra filme, mostrando que o filme conseguiu o mérito de seu alcance por si próprio. Mas, para esse segundo trabalho, houve um upgrade nessa questão e Celine trouxe três atores famosos para compôr seu casting: Dakota Johnson, Pedro Pascal e Chris Evans. Só o fato de você ter o Pedro Pascal num filme hoje em dia, já é o mesmo de, sei lá, ter o Hugh Grant no seu filme lá nos anos 90. Além disso, enquanto "Vidas Passadas" caía para o lado mais dramático e reflexivo sobre relacionamentos, esse faz a mesma coisa mas com uma trama remetente às velhas comédias românticas do final dos anos 90 e início dos anos 2000.

Acompanhamos a história de Lucy (Dakota Johnson), uma casamenteira que vive em Nova York e é a funcionária mais bem sucedida dentro de sua empresa, tendo já unido nove casais que, de fato, se casaram. Apesar disso, Lucy é solteira, e agora precisará lidar com sua própria vida amorosa, quando se vê no meio de um triângulo amoroso com Harry (Pedro Pascal), um empresário que vem de uma família bem sucedida, e John (Chris Evans), seu ex-namorado pobre cujo ela terminou o namoro porque ele era... pobre. Acontece que, dentro da cinefilia, isso tornou-se um pequeno fenômeno de discussão entre os cinéfilos sobre qual o lado certo: Pascal ou Evans. Essa pequena escolha de lados, que novamente envolve o Chris Evans, e que não leva a lugar nenhum também, porque o próprio filme é muito parcial em qual a decisão correta mais de uma vez e a mensagem da obra justifica toda essa briga como a visão dividida que envolve os relacionamentos amorosos nos dias de hoje. O que vale de verdade: uma relação por amor, ou uma relação por interesse?

A discussão que o filme traz sobre o amor é muito interessante, começando com um flashback meio confuso com humanos na época das cavernas se casando, e isso é algo que fica sem explicação até o final, mas quando ela vem, muita coisa que você viu e soava meio vazia, simplesmente começou a fazer sentido, toda a discussão sobre relacionamentos, especialmente nos dias de hoje, acaba fazendo sentido e traz algo que faz a gente coçar a cabeça sobre. Hoje em dia está cada vez mais difícil viver um bom relacionamento, as pessoas estão ficando cada vez mais exigentes sobre o que elas querem em um cônjuge, é cada vez mais e mais detalhes pequenos que as pessoas procuram, e isso é muito satirizado ao longo da exibição, vendo pela perspectiva da Lucy os pedidos absurdos de seus clientes para ela (não tankei a que queria uma lésbica conservadora de direita que morasse na cidade grande kkkkkk) e aí, apesar de ser tratado de forma cômica, não deixa de ser um retrato da nossa realidade atual, as pessoas ficam cada vez criando ideais para parceiros que as vezes não existem e que talvez não sejam alcançados, e é nessa ferida que Celine cutuca: precisamos mesmo ser tão exigentes?

As pessoas buscam um padrão, seja para se encaixar em um ou tentar se relacionar com um certo tipo, e é o que mais acontece hoje em dia. Procedimentos estéticos, filtros no Instagram, histórico familiar, conta bancária, salário anual, cada vez mais existem essas coisas que as pessoas dão valor demais e tornam-se muito interesseiras, hoje em dia grande parte dos relacionamentos é uma troca de interesses, talvez até sem os envolvidos saberem (ou uma recusa de acreditarem). É muito comum hoje em dia vermos mulheres no auge dos seus 20 anos casadas com CEOs de empresas com seus 50/60 anos ou até mais, pois tornou-se isso: a mulher vive bem, com muitos recursos, uma tranquilidade financeira e de qualidade de vida, enquanto em troca o homem recebe o bem mais escasso da atualidade, a famigerada b*c3ta. É óbvio que existem vários tipos de troca de interesses em relacionamentos, é que esse é o mais básico e comum de ser visto. Outra coisa é que nem sempre as pessoas que vão em busca de adentrar em um relacionamento encontram o que esperam, pois numa época de internet, Instagram e Tinder, é muito fácil bater o olho numa pessoa e se apaixonar por um ideal que você cria dela através da aparência, aí chega na hora e a pessoa é escrota, essa inclusive acontece e é parte crucial do terceiro ato daqui.

Esse conflito torna-se o grande conflito da protagonista, pois a Lucy é uma daquelas garotas que vai para a cidade grande, que tem necessidades que só o dinheiro pode suprir, que busca um estilo de vida confortável no qual vários dos cuidados que ela vai atrás são gananciosos, materialistas, cujo muito vai mais de sua vaidade e de uma possível aceitação social do que pelo o que ela realmente queria. É isso que o longa explora bem em colocá-la em um triângulo amoroso com um ricasso e um pobretão, pois o que vai falar mais alto? O que é mais benéfico? Existe amor num relacionamento que também há interesse? O que é sincero na sociedade atual? A Dakota Johnson entrega uma atuação muito sólida nesse quesito, pois ela consegue trazer e convencer todos os conflitos que ela enfrenta pessoal e profissionalmente, até um ponto onde o pessoal e o profissional as vezes precisam se fundir, e como o que ela faz define ou não define quem ela é. Eu gosto de como ela traz esse questionamento quanto a sua profissão e como ela vai percebendo o quão errado ela via seu trabalho ao longo do filme, como sua desilusão de um mundo perfeito vai acabando-se tanto na sua vida amorosa quanto em seu emprego e nisso ela vai percebendo as decisões erradas que tomou, as vezes em que foi babaca na sua vida e como ela ficou presa tanto tempo em um ideal que ela criou, que quando ela se livra disso, ela torna-se muito mais realizada.

A Celine Song traz essa trama de comédia romântica clássica da época do auge do subgênero, dos anos 90-2000, para o estilo de storytelling dela, que é algo mais calmo, mais lento, com uma construção visual mais artística e usando uma mise-en-scène que muitas vezes reflete o que é a personagem da Lucy, quando ela está em locais de riqueza, ela estando pequena em comparação ao cenário em sua volta e quando em meio a algo mais humilde, há um zoom quase sempre na cara dela, mostrando como ela se sente, pequena em meio a tanto luxo, mas grande perante pouca coisa, e como isso vai sendo mudado ao longo da exibição, onde chega em um ponto de equilíbrio. Eu entendi o que a Celine quis fazer aqui, realmente entendi a intenção, mas ela erra em todas as cenas que o Pedro Pascal aparece, porque, irmão, toda vez que aparecia a Dakota com esse maluco eu estava prestes a dormir, é uma condução que busca esse lado mais sentimental de sentir o que os personagens estão fazendo em cena, assim como em "Vidas Passadas", mas nessa de adaptar a situação para o estilo dela, essa foi a que menos funcionou, já que me deu uma preguiça. Eu já estou saturado de Pedro Pascal, já é a terceira crítica de algo que ele está envolvido que eu trago em 2025, e ainda o personagem dele me faz revirar os olhos, porque esse tipo de gente que ele interpreta é muito chata, daqueles caras que querem parecer bem sucedidos, peito estufado, engrossando a voz, se pagando de galã, ele interpreta esse arquétipo muito bem, mas mesmo assim toda cena dele parecia que não acabava, o filme não avançava, era chato demais assistir. Gostei do comentário que a diretora traz através dele, apesar de tudo, mas confesso que dei risada com o pequeno plot twist que envolve tal.

Já o Chris Evans manda muito bem, ele abrilhanta o filme e digo que as cenas dele elevam o longa, já que toda vez que ele está em cena, parece que compensa toda a chatice que o Pedro Pascal traz para o longa. Eu achei muito bom que toda a cena dele fazem questão de dizer que ele é pobre, que ele não tem onde cair duro, que ele é um fracassado, que ele é falido, que ele não tem condições de viver bem, toda cena reforça isso. É desnecessário? É, um pouco, as vezes forçam demais, mas ainda sim eu acho engraçado. O Chris Evans de longe tem os melhores diálogos do longa, acho todo o conflito do personagem dele algo bem escrito e ele fala várias coisas que me fizeram coçar a cabeça. A forma na qual ele entrega os diálogos te convence de que o amor é a única coisa que ele tem a ganhar na vida e que ele é um romântico desesperado. Eu gosto da relação dele com a Lucy, porque eu acho todo esse conflito que eles tem muito bom, todos os diálogos entre eles são incríveis, especialmente o terceiro ato, onde a discussão deles sobre amor e a forma como eles vão evoluindo através de suas conversas é excelente. A conversa deles enquanto assistem a um casamento é sensacional, ele perguntando: "por que as pessoas ainda se casam?" e ela respondendo: "a esperança de ser diferente", esse aí foi pedrada.

Enfim, acho que não tem muito mais a ser dito sobre "Amores Materialistas", vi muita gente reclamando, criticando o longa, mas a maioria das críticas que eu vi é porque o filme não era do jeito que as pessoas esperavam, até porque o próprio filme é vendido como algo mais próximo de uma comédia romântica padrão, os pôsteres dele, a sinopse, mas na realidade é a adaptação de uma clássica trama de comédia romântica para o estilo de storytelling da diretora, que eu achei funcional e impactante. É muito inferior ao anterior da Celine Song, Vidas Passadas é muito, muito superior, existe um abismo de diferença. Mas, ainda sim, eu gostei bastante do que vi aqui pela forma que Celine constrói essa personagem, essa trama, os diálogos e a coreografia de cena, acho tudo muito bem pensado, mas ainda tem problemas, acho que o ritmo se perde quando temos o arco do Pedro Pascal em cena, mas compensa quando tem o Chris Evans. Inclusive essa discussão que existiu aqui é muito inútil, é óbvio que o Chris Evans é muito mais pika, o cara não tem dinheiro, não tem emprego fixo, não tem sucesso, mas ele tem o poder do amor, que vale muito mais que a superficialidade e o dinheiro do cara que faz cirurgia para ficar mais alto.

Nota - 7,5/10

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