Crítica - Corra que a Polícia Vem Aí! (The Naked Gun, 2025)

Uma boa reinvenção de uma clássica franquia da comédia.

Clássicos da comédia dos anos 80 e 90, a trilogia "Corra que a Polícia Vem Aí!" é lembrada por muitas pessoas com um carinho imenso até os dias atuais, sendo filmes que marcaram uma geração, incluindo uma geração de brasileiros, que cresceu vendo a trilogia passando na televisão, já que eles passavam e eram represados muitas vezes. Muito desse carinho vem por conta de uma figura mitológica da comédia no cinema, o saudoso Leslie Nielsen, um dos mais engraçados que já tivemos. E fato também é que foi sua interpretação como Frank Drebin que deixou a franquia tão icônica e memorável até os dias de hoje. Agora, Nielsen já era velho nos anos 80, hoje em dia estaria na casa dos 100 anos, e não está mais entre nós. Então, na onda que Hollywood está de reviver e continuar toda e qualquer franquia de sucesso, como eles poderiam dar continuidade a esta? É claro, usando o artifício do filho. Porém, o que me deu esperança aqui, foi o nome de Akiva Schaffer, diretor de excelentes comédias que eu gosto muito, como "Popstar: Sem Parar, Sem Limites" (2016) e "Tico e Teco: Defensores e Lei" (2022), e terem escolhido Liam Neeson para protagonizar, o que é curioso, mas faz total sentido, já que Nielsen também era um ator de drama, que virou ator de ação para depois fazer uma transição completa para a comédia. Neeson dispensa apresentações, indo de dramas como "A Lista de Schindler" (1993) para o tiroteio de "Busca Implacável" (2008), agora, também chega em um papel 100% cômica, no que é um casting curioso, que gera um surpreendente e ótimo revival da franquia.

Seguindo o lendário legado de seu pai, Frank Drebin Jr. (Liam Neeson) é um tenente na polícia de Los Angeles, cujo tem feitos incríveis, mas que vive a vida toda para ser policial, sendo viúvo e fazendo apenas coisas de policial. Quando ele é relegado a uma divisão inferior, Drebin é colocado para investigar a morte de Simon Davenport, um engenheiro de software que estava mudando o mundo através da empresa Eden, liderada pelo maligno bilionário Richard Cane (Danny Huston), e que morreu misteriosamente em um acidente de carro. Durante a investigação, Frank se apega a Beth (Pamela Anderson), uma escritora, irmã da vítima, que inicia um flerte com nosso protagonista. No meio de uma conspiração que envolve bilionários do mal, a destruição do mundo e a reconstrução da humanidade, Frank Jr. precisa se provar para o Esquadrão de Polícia como alguém que ainda tem algo a oferecer, ao seu falecido pai que ele é digno de seu legado, e também a si mesmo como alguém que ainda tem um propósito para continuar nesta vida. Vamos lá, a história pouco importa nesse estilo de filme, é só uma desculpa para fazer o maior número de piadas possível, e bem, o Akiva Schaffer tenta fazer diversas piadas por minuto, resgatando a essência dos clássicos, e nessa de tentar muito acaba que muitas não funcionam, mas a maioria funciona mais.

Akiva Schaffer adota uma identidade que remete a um desenho animado em live action, trazendo algo totalmente cartunesco, abusando de um absurdo que deixaria a tropa do realismo em choque. É tudo para buscar as piadas mais absurdas e escrachadas que eles conseguiram pensar enquanto escreviam o roteiro, tem cada coisa bizarra aqui que tu fica pensando em como os caras pensaram nisso. É tudo para fazer piada, então tem piada em nos diálogos, visual, de situação, de expressão, tudo aqui é levado para o lado mais escrachado o possível, muito parecido com o que faziam historicamente na franquia lá no passado, mas aqui eles tem uma vantagem, que é o avanço tecnológico que naturalmente ocorreu nos últimos trinta anos, então aqui tem muita tirada, muita esquete, que envolve CGI. Acaba que o principal problema do filme é esse, já que como eles tentam muitas piadas, praticamente, vamos supor, uma piada a cada trinta segundos, que nessa, obviamente, muitas não funcionam, muitas não são tão legais quanto acharam que seriam. Claro, vai depender do estilo de humor que cada um tem, já que vai atirando para todos os lados, uma hora uma piada que te pega, acaba não pegando tanto outra pessoa. Tem piada ali que eu acho ruim, tem algumas piadas de peido, que é o tipo de humor que é para tirar riso de criança burra, aí isso me incomoda. Tem algumas piadas que são bem pensadas, mas que vão se alongando e acabam ficando chatas em um determinado momento, como uma envolvendo visão de calor e um cachorro, que na primeira eu ri, mas aí foi se repetindo tantas vezes em tão pouco tempo, que perdeu a graça, e esse é um exemplo de algo que acontece muito durante a exibição.

Mas, ao mesmo tempo tem tiradas e esquetes excelentes, que realmente me surpreenderam, pois não pensava que eles usariam um estilo de humor mais próximo ao do Leslie Nielsen, meu maior medo com esse filme era que eles dessem uma suposta atualizada e trouxessem um humor um pouco "TikTok", se deu para entender o que eu tô dizendo. Mas, meu irmão, eles fizeram isso aqui com piadas que casariam perfeitamente com o Leslie Nielsen usando a tecnologia de hoje. Pô, existe uma sequência aqui que eles usam magia negra para dar vida a um boneco de neve, fazem um ménage com ele, depois o excluem, o boneco fica com ciúme e tenta matar o Liam Neeson perseguindo ele como se fosse um serial killer e esvaziando a bombinha de asma, e depois é morto pela Pamela Anderson com uma espada. Esse é o nível de piada, é genial, essa sequência é brilhante. Tem algumas sacadas mais curtas que funcionam muito bem, questão situacional de cenários, ou diálogos rápidos que lembram muito dos originais, como uma cena que já está até viralizada, com o seguinte diálogo: "você atirou no meu irmão" - "podem ser milhares de pessoas" - "ele era branco" - "você é irmão do Tony". O diálogo é mais extenso do que isso, mas dá para entender a genialidade dele só nesse pequeno corte, o tom é certeiro. Outra muito besta, mas que eu ri, é que no final tem um evento de MMA e o Liam Neeson fica seminu no palco e dá um soco na cara do Bruce Buffer (esse filme também tem umas participações especiais muito aleatórias, incluindo o Weird Al Yankovic, que torna-se o único ator a estar presente nos quatro filmes da franquia).

O motivo mais claro de funcionar toda essa comédia, claro, é o Liam Neeson, uma excelente surpresa, porque ele combinou demais com esse papel, ele funciona perfeitamente. Primeiro de tudo, vamos começar pelo o que eu já falei, tanto ele quanto o pai fundador Leslie Nielsen eram atores conhecidos por filmes de ação, ambos tem a inicial LN, ambos fazem par romântico com uma modelo famosa que teve um relacionamento polêmico com um astro do rock décadas antes no filme, então teve um trabalho de casting bem interessante, que no final foi um encaixe não ortodoxo, mas que foi perfeito. Funciona porque o Liam Neeson não é engraçado, ele é tão sério, tem uma fama de ser tão carrasco, cara durão de ação, mas ele fazendo piada, soltando os maiores absurdos que podem ser ditos e ouvidos, meu mano, funcionou muito bem. Eu vi no idioma original, e a voz rouca e envelhecida dele falando as coisas mais absurdas do mundo daquele jeito ameaçador dele é perfeito, a quebra de expectativa que ele traz ali é excelente, parece que foi feito para ser ele como um sucessor espiritual do Leslie Nielsen, pois passa uma vibe muito parecida. Claro, ele é menos expressivo, mas acho que esse é o diferencial deste para os antigos que dá uma identidade própria a este aqui, já que dá um ar de novidade, um frescor, e acaba por funcionar com excelência. Sem contar que ele entrega bem nas cenas de ação, já falo mais sobre, mas a cara dele combina perfeitamente com essa parte, mas acho que a maneira que ele entrega as falas ainda é a melhor coisa, o monólogo final dele sobre matar alguém é um exemplo perfeito disso.

Neeson faz par romântico com a Pamela Anderson, que surpreendentemente funcionou bem aqui, se saiu melhor do que eu esperava. Claro, preciso fazer um disclaimer, de que é dela que vem a pior cena com a pior piada do filme, que é uma cena que ela começa a cantar fazendo barulhos inaudíveis, que é um momento chato e insuportável, simplesmente inacreditável que alguém viu aquilo ali e riu. Mas, no geral, ela funciona como um bom complemento, tendo um papel similar ao da Priscilla Presley lá nos filmes originais, uma porcentagem de participação parecida, e ela acaba sendo carismática, ela tem boas cenas, um timing que funciona em diversos pontos, mas o principal ponto é a química com o Liam Neeson, que é excelente, os dois combinam muito bem juntos em cena, tem uma interação que agrada em tela. Ainda tem o fato que eles viraram um casal na vida real também, teve até uma polêmica com o TMZ dizendo que foi fake para divulgar o filme, mas que até o momento não se confirmou, então leva a crer que é um relacionamento verdadeiro, e também é legal pois o Liam Neeson passou por tanta coisa, perdeu a esposa há mais de quinze anos e, coitado do velho, merece ser feliz de novo, muito legal que eles se apaixonaram no set, são fofos juntos.

É um filme que também tenta uma história um pouco mais séria envolvendo a ameaça, claro, nada aqui se leva a sério, mas tenta desenvolver um pouco a mais o quesito dos vilões, o principal sendo, basicamente, uma paródia do Elon Musk, o tal Richard Cane, que é esse magnata da tecnologia que finge querer mudar o mundo para melhor, tem bunkers e tudo, e funciona nesse quesito de paródia. É bem interpretado também, o Danny Huston manda bem nesse tipo de casting, do escrachado, do vilão mau por ser mau, e é esse lado vil que dá um tom cômico excelente para o personagem, um filantropo que se mete em tudo, que tenta investir e pôr sua imagem em tudo, e funciona, traz uma ameaça boa ao Drebin. Schaffer acerta isso na direção muito bem, esse tom de nada ser levado a sério, até as coisas que são mais sérias, como as cenas de ação, que são muito bem dirigidas nesse tom de paródia. A batalha final se inicia com uma baita cena do Frank Jr. segurando suas armas e saindo na mão com todo mundo chutando o armazenamento das balas na cara e no saco de todo mundo (sensacional). Creio que nisso a edição também seja um grande triunfo, pois tem muita agilidade ali, uma construção rápida, mas sútil, que consegue dar destaque para diversas piadas por minuto, mas sem perder o ponto de coesão da narrativa, que deixa o todo muito bom.

No final, é isso, não tem mais muito o que dizer por aqui, o resto não tem muito o que se desenvolver para gerar mais um parágrafo. Com isso, a nova versão de "Corra que a Polícia Vem Aí!" é tão carismática quanto a original, claro, acho que a antiga ainda é melhor, muito por conta do Leslie Nielsen, que é gênio, mas aqui também é excelente. Cara, surpreendentemente funcionou muito bem o Liam Neeson no papel principal, num casting praticamente perfeito, que funciona pois a seriedade e a falta de graça dele é crucial para o funcionamento do Frank Drebin Jr. como o fio que conduz a narrativa, ele tem momentos brilhantes durante o filme e acaba por funcionar também muito bem na relação dele com a Pamela Anderson, que foi tão boa que se alastrou para a vida real. Akiva Schaffer renasceu a franquia com primor, melhor que eu esperava, atualizando para os dias atuais, mas com um humor que reverencia os originais, funcionando muito bem, e tomara que vire uma franquia, pois acho que tem potencial para pelo menos mais uma história dentro desse universo, já que as possibilidades por aqui são absurdas e infinitas. No geral, tem muita coisa sem graça, que não funciona, mas o que funciona, funciona muito bem, gostei bastante.

Nota - 7,5/10

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