Crítica - Besouro Azul (Blue Beetle, 2023)
O verdadeiro Besouro Azul é a família que fazemos no caminho.
Primeiro de tudo, gostaria de iniciar o texto dizendo que se você aí do outro lado da tela me segue tem algum tempo, sabe que eu sou DCnauta fanático e adoro a DC ao ponto de escrever meus próprios filmes com os personagens da empresa, só que como fã, também há aquela hora de assumir a responsabilidade de dizer "chega!", porque de veio a ideia de filmar um negócio desses nesse momento? Pois a DC é uma marca que não se estabeleceu no cinema com o universo compartilhado, muito pelo contrário: virou chacota. A DC tem uma mania de achar que é a Marvel, que pode fazer filme de qualquer personagem que vai dar certo, mas não é assim que funciona e eu vou dar uma breve e sucinta explicação do porquê funciona na rival e não aqui: o MCU é uma marca estabelecida, que construiu bons filmes, bom marketing, conseguiu se vender pela qualidade de seus longas e faz tempos que consegue pôr hype e expectativa em troços como Guardiões da Galáxia, Capitã Marvel, Shang-Chi e outros que eram meros desconhecidos fora da bolha dos quadrinhos. A DC é justamente o contrário, conseguiu falhar com seus maiores heróis, fazendo com que uma obra que envolvesse Batman, Superman, Mulher Maravilha, Flash, Aquaman e Ciborgue se tornasse uma piada de mau gosto, tirou o Shazam para bosta no início desse ano, mal conseguiu vender o Flash que foi um dos heróis mais populares da última década graças a série de televisão, não tem capacidade nem coragem de fazer uma nova história do Lanterna Verde no audiovisual, mas decide pôr fichas para lançar o Besouro Azul nos cinemas. Parabéns, DC, você realmente merece todo esse fracasso que está levando nos últimos tempos, conseguindo alcançar com essa mediocridade o quarto fracasso de bilheteria consecutivo, tem que ser verdadeiramente muito incompetente para uma marca dessas.
O Besouro Azul é um herói de segunda, quase terceira prateleira da editora, já tendo o manto usado por Dan Garrett, Ted Kord e o mais reconhecido Jaime Reyes, cujo acompanhamos na obra. Acho exagero dizer que é um personagem desconhecido, pois ele apareceu no desenho "Justiça Jovem" (2011-2022) tendo uma demasiada importância na segunda temporada da série, apareceu uma vez lá em "Smallville" (2001-2011), também deu as caras nas animações do antigo universo animado compartilhado da DC, aparecendo em "Liga da Justiça vs. Jovens Titãs" (2016), "Jovens Titãs: O Contrato de Judas" (2017) e "Reino dos Superman" (2019), tendo bastante destaque nos dois primeiros. E por último, mas não menos importante (pelo contrário, o mais relevante), é um personagem jogável em "Injustice 2" (2017), inclusive você joga com ele no modo história, então o jogo praticamente te obriga a conhecê-lo (e é um excelente personagem no jogo, jogabilidade leve e versátil). Mas cara, um filme solo dele? Nos cinemas? Nesse momento? É, não dá para entender. Originalmente seria lançado na HBO Max, o que faria muito mais sentido e tiraria bem mais o peso da obra, mas por algum motivo acreditaram no projeto e promoveram o coitado achando que ia dar algum resultado, e ele teve, o problema é que foi negativo, fazendo meros U$45 milhões no fim de semana de estreia NO MUNDO TODO, é catastrófico, eu nunca vi algo tão fracassado quanto esse no universo de heróis, não desde o início da era de domínio do subgênero em 2008, ao menos. Mas será que esse péssimo resultado se reflete na qualidade do longa? Ou foi injustiçado?
Jaime Reyes (Xolo Maridueña) é um jovem estudante descendente de latinos recém graduado na faculdade que retorna para sua cidade natal, Palmera City, para ficar com sua família. Contudo, ao descobrir que seus familiares estão perto de perder a casa após aumento do aluguel e infarto do pai de Reyes, o rapaz decide procurar um emprego, nisso cruza caminho com Jenny Kord (Bruna Marquezine), herdeira do bilionário Ted Kord, um ex-super-herói, o Besouro Azul, que enlouqueceu após a morte da esposa e desapareceu, deixando sua companhia milionária nas mãos de sua irmã maluca, Victoria (Susan Sarandon), que faz de tudo para conseguir o Escaravelho, um artefato alienígena poderoso que pertenceu a seu irmão. Mas, quem encontra o objeto é Jaime, que é escolhido pelo inseto robótico para ser seu hospedeiro, tornando-se o novo Besouro Azul, um herói de armadura que consegue fazer tudo que deseja, virando um herói contra sua vontade. Agora Jaime precisará lutar duro contra Victoria e sua obsessão pelo poder, contra os problemas familiares, os obstáculos para salvar quem ama e para ficar com Jenny. Nossa, uma trama onde um herói que retorna para a cidade faz tempo, tenta se reaproximar da família, acaba achando um artefato que lhe transforma na versão de um herói cujo já teve o manto utilizado anteriormente por um bilionário e se apaixona pela filha do mesmo enquanto precisa salvar a empresa deste de algum maníaco por aqueles objetos que lhe dão poder, onde será que eu já vi isso antes? Sim, exatamente, é uma cópia quase exata do primeiro "Homem-Formiga" (2015) em sua trama, a única coisa que diferencia é que Jaime retorna da faculdade e a família envolve os pais, a irmã, a avó e o tio ao invés apenas da filha, mas de resto é idêntico, chega a ser bizarro.
Só por isso eu já retiro pontos do filme por não ter originalidade alguma, é um genérico de herói daqueles que é tão preguiçoso que como eu já denotei, é um Ctrl+C/Ctrl+V de "Homem-Formiga", que é um daqueles filmes do MCU que segue a fórmula e é apenas bom, não tem nenhuma inovação, não consegue ter ideias interessantes a serem exploradas, até o timing cômico é exatamente igual a de outros filmes, com os clássicos momentos do protagonista conversando com a voz dentro da sua cabeça e as outras pessoas estranhando, ou um primeiro beijo sendo interrompido antes de acontecer, e o mais clássico deles: os arquétipos familiares. Os caras não inovam nem na essência dos membros da família, literalmente temos a mãe preocupada e carinhosa, o pai sábio e batalhador, a irmã mais nova que é irritante e provocante, a avó que é velha (sim, é literalmente essa a qualidade dela) e o tio malucão conspiratório. Puxa, onde será que eu já vi isso antes? Não sei, talvez em um zilhão de longas da Sessão da Tarde! Cara, eu geralmente não me importaria se fosse divertido, mas até as piadas são batidas e sem graça, eu pouco me diverti assistindo, a única piada que eu ri de verdade foi no início e ainda foi uma piadinha escatológica porque eu sou retardado.
O cúmulo do genérico vem quando você vai analisar as jornadas do herói e dos vilões. O protagonista tem aquela clássica jornada que é a chamada "jornada do herói", que começa com o chamado, a recusa, e tudo mais, sendo a maior parte trabalhada de forma preguiçosa que não surpreende nem uma mosca, você olha para a jornada do Jaime e lembra que já viu aquilo um milhão de vezes, você sabe como aqueles obstáculos serão ultrapassados, como aqueles antagonistas irão sucumbir enquanto o herói se digladia com seu triunfo perante robozinho capanga genérico e depois o chefão. E os vilões, puts, estão facilmente entre os piores da história dos filmes de heróis, pois a Victoria Kord é um desperdício de Susan Sarandon, uma das melhores atrizes de sua geração, que é relegada a fazer uma caricatura de si própria enquanto só precisa reagir com olhar maldade às cenas, é um troço inacreditável, dá pena de ver aquela senhora de tantos filmes bons passando por isso. E o Carapax (Raoul Max Trujillo), que é o vilão "físico" da narrativa, nossa, que troço horrível, que conceito tenebroso, que adaptação péssima do que são os OMAC, um desperdício da história do material original, porque esse cara literalmente aparece com uma armadura de CGI de filme feito por fã, surra o protagonista e lança as linhas de diálogo mais soltas e batidas que existem, como "a sua família é o que te deixa fraco" e "você é só um garoto"... Cara, é impressionante como nem tenta ser diferente, é só mais um genérico.
Mas, nem só de males vivem as aventuras de nosso manito Jaime, tem coisas boas, a principal é o elenco. Apesar de já ter criticado os intérpretes dos dois vilões, o resto do elenco é bastante competente e cheio de carisma. Xolo Maridueña como o principal é um acerto gigantesco, eu já elogiei muito ele aqui nas críticas de "Cobra Kai" (2018-), ele é extremamente cativante, tem um timing cômico excelente e consegue trazer o drama quando necessitado, ele traz um peso crível para as cenas, você realmente acredita nos problemas que aquele cara passa e o quanto ele se preocupa com isso. A renegação dele em virar o herói no início até seu aceitamento é uma jornada meia bomba que só consegue ter o mínimo de decência graças ao nosso mano Xolo, que eu torço para que continue no papel como já foi confirmado pelo James Gunn, porque ele realmente merece essa segunda chance em alguma obra de qualidade. Saindo um pouco do elenco, acho o visual do herói perfeito, simplesmente sem erros, um traje que é 100% fiel aos quadrinhos e consegue passar a sensação de ser lúdico mas ser realista, traz o sci-fi e o quadrinesco sem fugir de uma proposta mais pé no chão, eu achei esse uniforme um dos melhores dos filmes de heróis no geral, sem sacanagem.
Voltando ao elenco e personagens, nossa Bruna Marquezine, atriz de um punhado de novelas da Globo, ex do Neymar (tem gente que se irrita real com isso, mas é um fato querendo ou não), finalmente debutou em Hollywood e olha... Mandou bem. Não é nada de extraordinário, mas ela atuando em outra língua funcionou e há uma dificuldade a mais em casos como esse, pois atuação = reação, e ela precisa traduzir para reagir e depois traduzir a sua fala e contribuir, é uma dificuldade que foi superada, o inglês dela é surpreendentemente muito bom e tem potencial para mais na indústria americana, foi uma grata surpresa (mas por favor, não venham tratar o Besouro como filme nacional ou ela como a atriz brasileira pioneira de Hollywood, Sônia Braga, Rodrigo Santoro, Alice Braga, Wagner Moura e muitos outros que vieram antes que foram os precursores). George Lopez como o tio Rudy é aquele arquétipo do criminoso maluco, conspiratório e com medo constante dos homi (basicamente a mesma coisa dos amigos do Homem-Formiga, meu Deus, a cópia vai ficando cada vez mais notável), mas o cara é incrível, com aquele visual meio punk, as atitudes extravagantes e a seriedade quando é necessitada acabam funcionando para a composição dele. A família dele inteira é muito bem escalada, você bate o olho em uma ou duas cenas e realmente crê que aquele pessoal é ligado genealogicamente, mas além do tio, vem para mim os destaques da irmã, Millagro (Belissa Escobedo), cujo a atriz traz bem essa aura da irmã caçula provocativa, mas que no fundo se importa, e o pai, Alberto (Damián Alcázar), que passa toda essa seriedade e experiência e como isso impacta no arco do protagonista.
De resto, não tenho mais nada a declarar sobre, acho que até peguei pesado demais com o filme e fiz ele parecer uma bomba horrorosa, mas "Besouro Azul" é um longa que pode divertir variando do seu humor. É genérico em tudo ao extremo, chegando a parecer cópia de outro filme de origem de um herói inseto da rival, não inova em nada, o arco do protagonista é a clássica jornada do herói, os personagens em sua volta são os clássicos arquétipos de uma família que você já viu em trezentas obras diferentes, a comédia é aquela padrão que se utiliza das mesmas piadas de sempre, tem dois vilões, um que é um empresário qualquer coisa que busca muito uma tecnologia e o outro que é tecnológico e dropa linhas de diálogo extremamente batidas para tentar desmotivar nosso herói (exatamente igual Justin Hammer e Ivan Vanko em "Homem de Ferro 2", o mesmo estilo), a falta de variação chega a esse nível. Tenta se sustentar através do carisma dos personagens, que verdadeiramente são cativantes, com o grande destaque sendo Xolo Maridueña como o protagonista e George Lopez como seu tio excêntrico, além da Marquezine que merece também seu crédito pelo bom trabalho em uma língua diferente - sem contar o traje perfeito do herói principal, que está dentre os melhores de todos os longas do subgênero. No final, creio eu que a divisão de opiniões será grande, mas particularmente não curti.
Nota - 5,0/10