Crítica - Que Horas Eu Te Pego? (No Hard Feelings, 2023)
Uma comédia adulta que há muito tempo não se via nos cinemas.
Nos anos 2000, praticamente haviam comédias focadas no pessoal adolescente e jovem adulto a cada semana, indo dos mais populares como a franquia "American Pie" (1999-2012) e "Superbad - É Hoje" (2007), e é claro, haviam as comédias românticas voltadas para a mesma galera, que faziam números impressionantes de bilheteria, sucesso entre o público alvo (e o ódio do resto, porque eram modinhas insuportáveis). Eventualmente, com o surgimento do cinema de super-heróis, o grande boom dos blockbusters de ação e a queda de interesse aos demais gêneros e subgêneros, a comédia acabou sendo bastante afetada, a comédia por si só, já que estas foram mescladas à ação, ficção científica, fantasia e outros, levando as obras engraçadinhas a se tornarem obsoletas, e virando um tipo de longa que é lançado exclusivamente para serviços de streaming, especialmente as dos românticos, já que estas foram quase extintas das salas de cinema. Então, com a entrada da década de 2020 e a busca pela nostalgia dos anos 2000, está havendo um ensaio de retorno para as romcoms, ano passado tentaram justamente trazer o final dos anos 90 de volta com uma dessas estrelada por Julia Roberts e George Clooney, intitulada "Ingresso Para o Paraíso" (2022). Aqui temos outra atriz famosa, Jennifer Lawrence, que toma a frente de uma dessas, saindo da sua zona de conforto e entrando em algo que é a cara dela, o que chamou a atenção de muita gente em relação ao longa, inclusive eu.
Seguimos a história de Maddie (Jennifer Lawrence), uma motorista de Uber que tem o carro rebocado e então precisa conseguir dinheiro para consegui-lo de volta. Nisso, ela vê um anúncio de um casal pedindo para achar uma namorada para seu filho de 19 anos fechado e antissocial, Percy (Andrew Barth Feldman), que precisará tirar a virgindade dele antes da faculdade, e em troca, recebe um carro. Mas, nisso, Maddie acaba realmente se afetuando pelo garoto enquanto enfrenta o drama dele não descobrir o porquê da sua aproximação e ir para a faculdade, ao mesmo tempo que ela lida com problemas financeiros e pessoais envolvendo seu carro, sua casa e seu rumo na vida. Quem dirige é Gene Stupnisky, que fez o relativamente famosinho "Bons Meninos" (2019) - o famoso Superbad de criança - e aqui ele busca novamente resgatar esse besteirol dos anos 2000 através de uma comédia romântica, fazendo piadas adultas, que envolvem sexo e... sexo? É, piadinha de sexo para todo lado e sei que é um humor divisivo, mas como meu senso de humor é bem questionável e esse tipo de zoeira de quinta série me conquista, seja piada com todas as etapas e situações de uma vida sexual: virgindade, ejaculação precoce, ansiedade, depressão pós-sexo, sem compromisso... Só coisa boa. Eu sinceramente curto esse tipo de humor aqui, pois é balanceado, se calca nisso, mas não é exagerado ou forçado, é uma vibe bem gostosinha até.
No entanto, o empecilho para o longa ser melhor é a parte dramática, já que por quarenta e cinco minutos se sustenta nessa comédia besteirol com a JLaw se oferecendo para o moleque enquanto ele faz uma cara de assustado e não entende nada do que acontece, mas depois daí, torna-se um dramalhão exagerado com os momentos cômicos virando pontuais dentro da narrativa. O problema não é existir uma carga dramática, mas sim ela ser extremamente pesada, quebrando o ritmo divertido que o longa vinha oferecendo anteriormente, saindo de uma aventurazinha romântica para uma busca de profundidade desnecessária encima de personagens que não precisam de um aprofundamento para funcionar. É anticlimático, são situações de um nível muito acima do que precisavam ser, e tudo isso para tentar diminuir a barra de que uma relação de uma mulher de trinta anos com um garoto de dezenove não é esquisito. Eu sinceramente não me incomodo com isso justamente por ser um longa ficcional, eu tenho a noção de que são apenas atores desempenhando os papéis cujo eles foram contratados, mas parece que o longa tenta fugir dessa responsabilidade e nitidamente tenta fazer com que pareça menos esquisito para o público geral, o que gera momentos um pouco desnecessários e covardes em criar um relacionamento de verdade entre os dois protagonistas.
Contudo, esses problemas são compensados com o tamanho carisma do casal principal. Na realidade, Andrew Barth Feldman faz justamente o contrário do carismático, ele interpreta um antissocial, um cara bem fechado, travado, mas que precisa se soltar algumas vezes e vencer essa timidez, ele tem boas cenas, um olhar de assustado que convence o espectador, tem uma cena que ele canta que é maravilhosa, uma baita voz num grande cover de "Maneater" da dupla Daryl Hall & John Oates, porém, ele comete alguns tropeços e acaba caindo no overacting, sendo expressivo até demais em algumas cenas e isso incomoda um pouco, mas, como é novato, vou dar uma colher de chá para este vagabundo. Já a Jennifer Lawrence é perfeita, essa personagem é a cara dela, ela faz essa mulher que é meio sem rumo, trabalha com qualquer coisa e transa com homens quaisquer a cada final de semana, ela só tem uma casa e um carro (que ela perde) e se resume a isso. É um desenvolvimento interessante de como ela sai dessa pessoa vazia para alguém que entende o que precisa fazer, como que é gostar verdadeiramente de alguém, e ela é excepcional na comédia, ela tem o sex apel e consegue moldá-lo para algo que causa uma certa vergonha alheia e gera essa comicidade realmente engraçada, é uma excelente atuação para esse tipo de filme.
Cara, é isso, não tem muito o que falar, é uma comédia romântica comum que você via a cada semana em 2004, mas dessa vez adaptada para a realidade de 2023 e ponto final. "Que Horas Eu Te Pego?" (excelente título inclusive, principalmente para chamar a gata para assistir) é uma daquelas comédias escrachadas, que tem a comédia baseada em piadinha de sexo e funciona muito bem, é uma excelente opção de entretenimento para os domingos de tarde. Apesar de exagerar muito na parte dramática, acaba sendo funcional pelo carisma do casal principal, a mensagem do final e as jornadas enfrentadas pelos protagonistas, além de uma boa revelação que é Andrew Barth Feldman, que apesar dos tropeços de novato, é sutil e manda bem, enquanto Jennifer Lawrence é um colosso cômico entregando um papel que é perfeito para ela, encaixando muito bem em sua persona. É basicamente isso, não tem muito a ser aprofundado, mas é bom ver filmes como esse tendo espaços no cinema ainda, já que hoje é quase status quo uma romcom ser lançada na Netflix e bombar, e ver uma velha nova opção nas telonas é bem legal, fez quase U$90 milhões de bilheteria e para algo desse orçamento e com um lançamento limitado perto dos filmes de sua época de estreia, foi ótimo. Recomendo, é legalzinho.
Nota - 7,0/10