Crítica - Não Se Preocupe, Querida (Don't Worry, Darling, 2022)
Quando os bastidores são mais interessantes que o filme.
Existe uma lista famosa em Hollywood, chamada The Black List, que anualmente anuncia os melhores roteiros independentes que precisam de orçamentos para serem produzidos e em 2019, a primeira versão deste filme estava lá e logo a atriz e diretora Olivia Wilde, ainda na ressaca de seu sucesso como estreante, "Fora de Série" (2019), foi designada para dirigir e logo a New Line comprou os direitos. Com o elenco escolhido, parecia um futuro sucesso certíssimo. Contudo, uma série de polêmicas se iniciaram desde a pré-produção, indo desde a demissão do Shia LaBeouf (por motivos óbvios, para quem sabe) e disso foi para chifre, tretas internas, suposta desigualdade salarial e até um cuspidão ao vivo em Veneza, com isso, a obra foi de uma das mais esperadas do ano, para uma das mais temidas de ser uma verdadeira bomba. No fim, ocorreu uma divisão altíssima, mas eu sempre vejo mais comentários negativos que positivos. Na minha opinião, as histórias de bastidores são infinitamente superiores, pois o filme se torna tão desinteressante durante a exibição que você percebe que as fofocas não foram marketing, inclusive deve ter rolado até mais coisa que não foi divulgada pelo tanto de coisa ruim que acontece.
Minha primeira crítica vai à própria diretora, pois se você tem um roteiro que é considerado um dos melhores que não teve orçamento para ser lançado, para que mandar alguém reescrever? Para que alterar? Pois dá para perceber cenas que são desconexas uma da outra só pela maneira que acontecem, não consigo julgar pelo roteiro em si porque eu não li nem lerei, mas tem várias coisas ali que aparentam ter sido escritas e/ou dirigidas por pessoas completamente diferentes. É uma bagunça total, chega a um ponto que você nem sabe e nem liga mais para o que está acontecendo, a Olívia Wilde saiu de seu debut que é bom e vem fazer algo de orçamento alto, elenco forte e faz uma porcaria gigante, na realidade não parece que esse filme tem alguém dirigindo, é algo totalmente avulso que a presença dessa mulher parecia nula no set, tudo acontece por acontecer e é isso, não há apego pela história ou pelos personagens, quando vem o plot twist você nem tá ligando mais, se surpreende apenas pelo o quão ruim ele é e a prepotência da diretora em sua condução para tentar parecer genial.
É realmente decepcionante, pois as bases são bastante interessantes, a principal sendo claramente "O Show de Truman" (1998), mas também tendo suas referências em "Laranja Mecânica" (1971), "Matrix" (1999), "A Origem" (2010) e até um pouco de "Corra!" (2017), com essas influências fortíssimas você espera pelo menos algo aceitável, mas o ritmo é mais perdido que cego em tiroteio, a montagem que tenta utilizar de visões ou bizarrices surrealistas não tem quase nenhuma função além de uma ligação barata mal feita em uma certa cena, ele tenta ser tipo aqueles filmes para adolescentes de Twitter que se surpreendem com qualquer coisa idiota que é retratada durante a exibição como uma coisa super complexa sendo que é bem simples. O plot twist é besta também, não é ruim por si só, mas dentro de uma obra que você já não tá ligando mais há muito tempo, acaba tornando algo potencialmente brilhante em um negócio sem graça e broxante, porque o que aparenta é que o único objetivo é esse, agradar adolescente que é otária.
Essa finalidade de fisgar essas garotas ainda tem um plus enorme que deve ser o motivo das notas do público não serem tão baixas: Harry Styles. E sendo sincero, nada contra ele, eu até gosto dele como cantor e compositor, ele é bastante criativo, porém quem pensou que transformá-lo em ator seria uma boa ideia? A performance dele é extremamente caricata, inexpressiva e risível mais de uma vez, chega até a ser surpreendente que ele faça mais expressões em seus shows onde ele já tá cansado para caramba do que na desgraça desse filme. Tem uma cena bem no meio que é dentro de um carro e ele começa a se lamentar, só que é tão overacting (no quesito negativo) que eu gargalhei, porque eu verdadeiramente não consegui aguentar ver o One Direction chorando e se debatendo igual a uma criança mimada na cena mais engraçada não-propositalmente do ano. Quando você tem atores profissionais sofrendo para conseguir papéis, esse cara que sim, é um artista, mas não é um ator, consegue um protagonismo em um filme desse calibre, chega a ser inacreditável.
Inclusive parece que todo o elenco aderiu a essa coisa caricata, o que até faria sentido visto a proposta, porém no desenrolar da trama você percebe que não é por causa disso, é de uma péssima gestão de elenco mesmo, pois em vários momentos em que precisava de uma dramaticidade maior, as performances robóticas apareciam para fazermos perder cada vez mais a atenção pela ruindade. A Olívia Wilde tá fazendo aqui o que deve ser o pior trabalho de sua carreira no geral, é um combo, porque ela dirige mal e atua mal, a retratação dela da personagem Bunny é bastante incomodativa, pois você percebe uma falta de interesse notável e as vezes até uma vontade de explodir contida em cenas com alguns atores (o que eu não julgo, pois vendo as polêmicas que estão rolando, deve ter sido um verdadeiro inferno ter que liderar esse set), também tem a Gemma Chan, uma atriz que vinha em crescente, mas que aqui é subjugados a um papel inútil que você nem se lembra que ela está lá. Por fim, Chris Pine, cujo a maior contribuição dele à obra foi levar um cuspe do Sr. Boyband, que deve ter ajudado bastante no marketing, mas o potencial que ele tinha para ser um grande contraponto para a protagonista é totalmente desperdiçado ao quase não ter cenas com ela nem indiretamente, ele só está lá por estar e azar.
O que salva é mesmo a Florence Pugh, coitada da mulher, é uma baita atriz, faz sempre as melhores personagens de seus projetos, mas a maioria deles é bem ruim, o que se salva são poucos, no máximo uns três e aqui não muda muito, ela faz bem o seu papel em uma performance gigantesca onde ela tapa alguns buracos e faz até parecer que esse filme nem foi tão ruim. Quando o drama é convincente, é por conta da atuação dela. Quando o suspense funciona, é por conta da atuação dela. Quando você se apega com alguém, é com ela. Ela carrega nas costas e até parece que estava com vontade de atuar, acaba por convencer muito bem no drama, ela faz o espectador acreditar em sua paranóia em certos momentos e ela tem uma cara de desespero que é fácil de crer nos acontecimentos com a sua personagem. Ela carrega tanto esse lixo chamado de filme, que eu decidi aumentar a nota em dois pontos, porque o esforço dela não merece uma nota tão baixa.
No mais, eu detesto como a crítica social que tentam transpassar é um potencial gigante desperdiçado. Até me lembrou de um filme que muita gente gosta mas eu detesto que é o "Cisne Negro" (2010), que mostra essa busca pela perfeição sendo procurada de formas superficiais contra sua própria vontade, mas assim como a obra do Aronofsky, na minha opinião, acaba caindo em um intelectualismo forçado e nonsense com montagens baseadas no surrealismo que são colocadas apenas para confundir o espectador. Outra oportunidade de crítica perdida é em relação ao machismo, onde tenta se parecer implícita durante toda a narrativa, mas na verdade não tem nada, foi mais usado na propaganda que na própria obra e não, colocar uma mulher sendo dona de casa não é uma dura na misoginia, não chega nem perto de ser suficiente. Em certo ponto, a Wilde acaba até sendo machista ao colocar cenas sexuais desnecessárias para a trama, apenas tentando demonstrar de alguma forma o que o Harry Styles fez com ela para conseguir o papel, essa é a única explicação possível. No mais, poderia ter sido algo muito mais crítico e pesado do que foi.
Apesar de ter gente que gosta, eu acabei por achar "Não Se Preocupe, Querida" um grandíssimo potencial desperdiçado, pois perde oportunidades de críticas sociais, perde a oportunidade de criar um baita vilão, perde a oportunidade de gerar um plot twist genial e surpreendente para acabar fazendo algo sem graça, chato, vazio, intelectualmente egocêntrico e que se preocupa mais em agradar adolescentes da internet do que em ser bom. Essa nota só é tão grande assim por conta da Florence Pugh que está maravilhosa e deveria ter consultas diárias com o quiroprático por ter carregado esse filme inteiro nas costas e não tenho mais nada a declarar, a não ser pedir que vejam porque meu objetivo não é fazer ninguém de assistir, confiram a obra e formulam sua própria opinião. No mais, só gostaria de falar que a querida Olivia Wilde deveria realmente se preocupar.
Nota - 4,5/10