Crítica - Nada de Novo no Front (Im Westen nichts Neues, 2022)

Um remake que faz jus ao original e bate de frente com o mesmo.

Não é a primeira vez que o clássico "Sem Novidades no Front" (1930) de Lewis Milestone é refeito, houve um primeiro remake em 1979, feito em uma co-produção entre Estados Unidos e Grã-Bretanha, porém, agora em 2022, ganhamos a versão da história cujo realmente foi produzida no país em que acompanhamos na trama: a Alemanha. Quando você tenta trazer clássicos do passado para o presente, há duas alternativas opostas sobre o destino dela: ou você consegue ótimos resultados a ponto de gerar um debate para qual é o melhor entre a releitura e o original (tal o caso de "Scarface" e "Os Infiltrados"), ou então fica uma porcaria e ninguém gosta (como "Psicose" de 1998). É um risco muito grande tentar adaptar um clássico para nosso tempo pois comparações são inevitáveis e perder a essência do antigo não é algo muito difícil, alguns conseguem fazer uma adaptação sem deixar de ter esse encanto pela história, a atualizando de forma perfeita e deixando-a superior à base, como é o caso de "Amor, Sublime Amor" de Steven Spielberg (que foi meu filme favorito do ano passado). Este filme está mais para este caso, apesar de não ser melhor que o original.

Praticamente, não há muito o que mudar em questões de argumento do meu texto anterior para este aqui, porque é o mesmo filme, a mesma história, a mesma mensagem, as mesmas críticas, os mesmos personagens só que com algumas mudanças drásticas na trama que acabam dando um toque de adaptação mesmo para a obra e não são só alterações que são feitas só para dizer que são diferentes do original, elas realmente alteram a essência e o tom do filme, deixando ele mais pesado, sério e realista. Enquanto o clássico de 1930 está interessado em mostrar o horror da guerra através de uma maneira artística, com longos diálogos e monólogos com estilos teatrais, aqui temos mais demonstração do que falatório, vemos o terror do front sendo demonstrado visualmente, o que deixa ele mais assustador, poucas palavras são ditas durante a batalha, as cenas de confronto são um espetáculo visual que conseguem magistralmente através da montagem e da maquiagem criar um ambiente de guerra e demonstrar todo o inferno terrestre que aquilo é, como o original de 1930 foi o primeiro grande filme de guerra, não haviam muitas inspirações, agora enxergamos influências técnicas e visuais de Steven Spielberg em "O Resgate do Soldado Ryan" (1998), Oliver Stone em "Platoon" (1986) e Sam Mendes em "1917" (2019) - esse último principalmente por se tratar da mesma guerra, e com todas essas referências, o filme ganha pontos tecnicamente, superando todos os citados (exceto o Soldado Ryan) na parte técnica.

Acompanhamos novamente a jornada de Paul Bäumer (dessa vez interpretado por Felix Kammerer), onde seu desenvolvimento é feito inteiramente na guerra, vemos ele sendo trabalhado ao longo de duas horas e vinte, desde o jovem sonhador na Alemanha querendo servir e virar um herói para seu país, até um homem mentalmente destruído com sede de vingança que só quer que aquilo acabe o quanto antes. O diretor Edward Berger está mais interessado em mostrar sua desconstrução de personagem somente na guerra do que fora dela, tanto que algumas cenas memoráveis no clássico dos anos 30 não estão aqui e esse certo desenvolvimento é mais realista, mas acaba tirando um pouco do peso para quem assistiu ao original. Porém, Paul aqui é absurdamente bem trabalhado, em uma performance bem mais quieta e expressiva de que a de Lew Ayres, Felix Kammerer faz uma grande performance ao demonstrar apenas com seu rosto o horror de estar envolvido no meio da pior coisa que um ser humano pode estar vivendo, apesar de em alguns momentos soar exagerado, acaba funcionando bem, pois ao final ao vê-lo raivoso e impaciente, faz com que toda a narrativa do filme se concretize dentro de seu sentido e de sua mensagem.

A mensagem que a história passa continua sendo a mesma: Será que vale a pena morrer pelo seu país? Será que é válido realmente demonstrar toda essa fidelidade à sua pátria? É certo ir lutar por problemas que não são seus? E por aí vai, essas mensagens sendo demonstradas em um filme de hoje em dia, com todo nosso contexto atual, é bastante importante. "Ah, mas já tinha essa mensagem no de 1930", meu brother, apesar de ser excelente, ninguém irá assistir hoje em dia a um filme preto e branco do início da Era de Ouro de Hollywood com técnicas e edição datadas, além de ser quase inacessível, enquanto este é um filme que está estreando mundialmente pela Netflix e é um concorrente grande ao Oscar 2023, não só a Melhor Filme Internacional, mas também a categorias como Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Filme, e com certeza, nesse momento de invasão russa e os motivos mais egocêntricos possíveis de um chefe de estado, tem uma alta porcentagem de indicação e será importantíssimo a sua nomeação a pelo menos essas três categorias para que mais pessoas assistam a obra e notem que isso de fazer tudo pelo país é um exagero dos grandes (Legado do futuro: editando o texto no para avisar que foi realmente indicado a essas três categorias e quase ganhou todas kkkkkk, mas acabou vencendo só a de filme internacional, obviamente).

Outra coisa que eu gostaria de destacar é Kat (Albrecht Schuch), que é um personagem que eu esqueci de abordar sobre na crítica do original e eu preciso falar, porque a história não é a mesma sem esse cara, o carisma do ator é notável tanto neste quanto no primeiro (especialmente no primeiro) e o que faz a trama rolar é ele, pois ele tem momentos épicos, atitudes cômicas realmente engraçadas nas situações, uma excentricidade inconfundível e você acaba se apegando a ele por esse carisma inigualável. Quando ele morre, você sente como se um parente próximo tivesse acabado de falecer, pois ele é tão legal que é sentido a sua falta imediamente. Eu só não gostei da forma escrota que adaptaram sua morte aqui, a versão original é muito superior, aqui chega a ser quase cômica e meio ridícula, o cara foi assassinado por uma criança enquanto ia mijar no mato por roubar uns ovos (único problema verdadeiro do longa).

Um grande remake, "Nada de Novo no Front" cumpre bem seu papel de atualizar uma história clássica do cinema ao deixá-la em um tom mais sério, frenético e realista do que um tom artístico, teatral e emocional. Continua sendo uma história poderosa, mensagens atuais que precisam ser espalhadas de qualquer forma e acima de tudo, provam como a guerra é um inferno que só vai te destruir e que essa coisa de bancar o herói e sair matando um bando de figurante é uma mera fantasia hiperbólica. Não supera o original, mas a imersão na história é grandiosa e é um filme que precisa ser visto por muita gente, ainda bem que ele estreou em uma plataforma com tanto alcance quanto a Netflix.

Nota - 8,0/10

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