Crítica - Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal (Indiana Jones and the Kingdom of the Crystal Skull, 2008)
Um tutorial de como arruinar o que era perfeito.
Indiana Jones sempre era lembrado como uma das melhores trilogias da história, uma cujo os três filmes eram e são consensos de público e crítica até hoje, com os excelentes "Os Caçadores da Arca Perdida" (1981), "Indiana Jones e o Templo da Perdição" (1984) e "Indiana Jones e a Última Cruzada" (1989). No entanto, quando algo desse tamanho fica parado por tanto tempo nas telonas, surge aquele famoso papo de trazer de volta, de tentar realizar uma nova aventura, uma passagem de bastão, ou até rebootar tudo, aqui inventaram de fazer uma sequência que tinha potencial, um orçamento altíssimo com uma equipe e um elenco de alto nível, que traz de volta Steven Spielberg como diretor e Harrison Ford como Indy, além de Karen Allen voltando como Marion Ravenwood, Cate Blanchett, que naquela época era queridinha de Hollywood, vencedora do Oscar e indicada algumas várias vezes, e o nosso execrável Shia LaBeouf, que era o ator mais promissor da época e todo mundo queria ele na sua franquia (hoje o que ninguém quer é ele perto de outro ser humano). Você vê que o investimento é gigantesco, que os caras pensavam que iam reinventar a franquia, mas só ficou no pensamento mesmo, já que esse filme é uma belíssima de uma porcaria completa, que não faz nenhum sentido, que é bizarro em vários pontos, é um teste enorme para suspensão de descrença e em certos pontos parece mais uma esquete ruim do Saturday Night Live do que propriamente um filme da franquia e do diretor.
Na história, vemos Indiana Jones (Harrison Ford) voltando mais de vinte anos depois de A Última Cruzada, onde aqui ele está mais velho e é convocado por Mutt Williams (Shia LaBeouf), um jovem destemido e descolado, para salvar o antigo amigo dele, o também arqueólogo Professor Oxley (John Hurt), no entanto, Indy precisa enfrentar os soviéticos e até alienígenas para salvar o seu companheiro de profissão. Primeiro que é bizarro em tudo, desde a introdução é um erro gigantesco. Na realidade, estou sendo injusto, até porque tem uma parte muito boa, que são os primeiros dois minutos onde toca a versão de "Hound Dog" do Elvis Presley, o que vem depois daí são apenas passos largos para trás, já começando logo no prólogo com sua esquisitice. Se passando na época de Guerra Fria, era óbvia a inclusão dos soviéticos nessa história, no entanto, eles são tratados daquela forma maquiavélica mais batida possível numa abordagem que perdeu a graça e o sentido em 1988, ainda usando de um estilo cômico horrível, com um timing quase inexistente, e que a comédia vem mais por diálogos infames mal escritos e acontecimentos tão absurdos que conseguem ferir as leis da física dentro de um filme de fantasia. Eu não sou um grande fã dessa coisa de realismo no cinema, sempre falo isso, mas aqui é algo tão inacreditável que quebra a tal da suspensão de descrença, pois estamos vendo um longa onde o protagonista sobrevive a um teste de bombas nucleares se trancando em uma geladeira (só faltou ele surfar na porta enquanto caía heroicamente da explosão).
Chega a ser inacreditável pensar que foi o próprio Spielberg que dirigiu, parece que ele só foi creditado, não tem nada que lembre seu estilo e o da franquia. Tentam trazer a essência dos longas anteriores apenas em momentos pontuais e mesmo assim é um sentimento esquisito, porque é tudo feito de maneira robótica, sem emoção nenhuma, coração vazio, não traz o mesmo sentimento de você ver o Indiana correndo de uma rocha gigante, ou da fuga do Templo, ou a cavalaria em direção ao pôr-do-sol, a sensação que traz é o tédio, nada mais nada menos que o sono, porque a história já é chata na busca do Dr. Jones com o Mutt, mas aí com a entrada dos russos consegue ficar pior, depois um draminha sem graça do Indy com a Marion envolvendo a relação deles, aí tem a Cate Blanchett com o sotaque russo mais estereotipado da história, é tudo mais esquisito do que deveria. O storytelling é péssimo, sem ritmo, o que fizeram com a franquia é imperdoável, é uma ofensa aos fãs, que deveria ser proibido por lei por desacato à arte, é uma aberração, uma ofensa, que eu estou tentanto não perder meus neurônios aqui.
É tão bisonho que acaba sendo uma comédia não-proposital, você ri de coisas que se levam a sério, parece um episódio ruim do Batman do Adam West pela bizarrice sessentista boba e infantil. O problema não é ser desse jeito, Indiana Jones foi uma franquia familiar que passou ao longo dos anos 80 todo, mas aí eles tentam mesclar o lado mirim com piadas para os adultos que viram os clássicos quando menores, ou seja, ficam situações abobalhadas misturadas com piadas de sexo e outros assuntos de adulto, cujo uma criança fica boiando ali. A vibe é muito estranha, não sabe se encontrar, não sabe o público para qual ele quer se voltar, é apenas uma grande bagunça, é um caça-níquel que se aproveita da marca Indiana Jones e dos nomes envolvidos de Harrison Ford, Shia LaBeouf, Cate Blanchett, e Steven Spielberg para se promover. Cara, eu não consigo pensar em nada que se salve de verdade, porque tudo minimamente bom é arruinado, ou pela escrita, ou pela direção extremamente esquisita e monótona. Coisas boas vão mais para a parte técnica, tem um design de produção excelente, muito bem feito, construções que conseguem remeter à franquia clássica e dão o ar de aventuroso que precisava. Figurino também é muito bom e consegue fazer uma recriação da época e homenagens bacanas, com as roupas da Marion e do Indy. Mas é só isso, não tem nenhum conteúdo que funcione melhor.
Com toda a certeza o Harrison Ford odiou voltar, ele tenta trazer a mesma sensação de antes, mas acaba falhando miseravelmente ao deixar o Indiana Jones caricato em uma atuação preguiçosa, chata e extremamente overacting em vários momentos, ele dá uma exagerada desnecessária que parece que ele já estava de saco cheio (conhecendo ele, é possível mesmo, quase uma certeza na realidade). O pior é tentar insinuar uma passagem de bastão para o Mutt, o Shia LaBeouf, que é um personagem terrível, insuportável, que não tem nenhum carisma, é apenas uma tentativa mercadológica de recriar a franquia novamente a partir dele e, como sabemos, falhou miseravelmente. Essa época do Shia LaBeouf galã sendo protagonista de todas as franquias foi um surto coletivo, na moral, esse cara se destaca mais pela maluquice no que nos papéis mesmo, apesar de ter atuações excelentes na carreira, essa definitivamente não é uma delas. A Cate Blanchett, o John Ford, o Jim Broadbent e o Ray Winstone, todos atores mega premiados, conhecidos, caros, com currículos invejáveis, se submetendo a papéis esquecíveis, genéricos e que não tem nada demais, eu aposto que você não lembrava que os três últimos participaram do longa, por exemplo. A Karen Allen como Marion se salva um pouco, conseguindo misturar o carisma e o talento dela com a nostalgia, mas acaba sendo deslocada no meio de todos os outros.
Se você gosta de "Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal" eu admiro muito você, eu não sei o motivo, mas você deve ter uma baita paciência, uma suspensão de descrença impressionante, ou uma ignorância muito grande, porque sinceramente eu não consigo. Harrison Ford perdido odiando estar ali, Shia LaBeouf no modo mais pateta possível, Spielberg não parecendo Spielberg e sim um diretor qualquer. Tem méritos técnicos, tem uma boa participação da Karen Allen como Marion, mas na minha humilde opinião, é extremamente entediante, sem sal, sem personalidade, sem carisma, sem emoção, sem sentido, sem qualidade, sem graça, sem amor próprio, sem noção, sem caráter, sem responsabilidade, sem criatividade, sem conteúdo, sem dignidade, sem vergonha, sem respeito, sem condições e sem o menor motivo para existir. Tomara que James Mangold faça com que a franquia retorne aos trilhos em seu capítulo final.
Nota - 3,0/10