Crítica - Velozes e Furiosos 10 (Fast X, 2023)

Nem pra entreter essa franquia presta mais.

Velozes e Furiosos provavelmente é a maior franquia do cinema de todos os tempos, e você deve ter tido um leve ataque cardíaco, mas não é nesse sentido que eu estou falando. Estamos no décimo filme, sem contar curtas e spin-offs, e existem maiores em números de filmes, tem 007, o próprio MCU e várias franquias de terror, mas, sendo uma história contínua, com mais de vinte anos de duração e mantendo os mesmos atores dos primeiros longas ainda como protagonistas, lançando continuamente em espaços de dois/três anos, acho que nunca teve nada igual. Começou como a franquia do racha, cujo nós víamos para ver carros correndo uns contra os outros e mais uma historinha de crime ali no meio para descontrair, virou uma franquia de agente secreto onde todo mundo do bem milagrosamente sabe lutar todas as artes marciais do mundo, os caras jogam Rocket League em Roma com uma bomba em chamas e tal. Sinceramente não me importo com essas loucuras que extrapolam a realidade, o cinema é isso, ficção, porém parece que chegou num momento em que qualquer coisa é feita e lançada só para ganhar dinheiro encima do nome da franquia. Tem qualidades, bons personagens, excelentes cenas de ação, efeitos visuais, mas no final é mais um blockbuster qualquer da franquia que faz até uma abelha broxar.

A série já virou uma galhofada há muito tempo, desde o quarto ou o quinto, isso é um fato, porém, parece que ainda tem medo de se assumir como algo ridículo. No décimo longa, um retcon é feito e voltamos com um flashback para "Velozes e Furiosos: Operação Rio" (2011), onde vemos que Hernan Reyes (Joaquim de Almeida), o vilão daquele filme, tinha um filho que estava lá o tempo todo: Dante (Jason Momoa), que depois de ter morrido por alguns minutos na cena da Ponte Rio-Niterói, volta depois de vários anos para se vingar de Dominic Toretto (Vin Diesel) e a Família (e faço questão de escrever Família com F maiúsculo durante todo o texto para enfatizar, já que é o mais importante). Mas para mim, a verdadeira ameaça não é o Drogo, mas sim o diretor, Louis Leterrier, o qual eu não gosto nenhum pouco, acho ele na realidade muito fraco para o tamanho dos trabalhos que ele realizou no cinema, mas faz jus com as bilheterias que essa franquia vem recebendo, muita quantia para pouco conteúdo. Leterrier leva muito a sério, o que contraria grande parte do elenco, que passa muito tempo na minutagem zoando e fazendo muita coisa aleatória, mas Leterrier, com Vin Diesel como seu cúmplice, tenta fazer um drama de ação com muitos carros e explosões e o resultado é, minimamente, esquisito.

Leterrier faz uma história única durante os primeiros trinta minutos, depois divide a trama em várias linhas narrativas, são quatro, mais especificamente: Toretto vindo ao Brasil (BRASIL SIL SIL SIL SIL) para se resolver com Dante; Tej (Ludacris), Roman (Tyrese Gibson), Ramsey (Nathalie Emmanuel) e Han (Sung Kang) foragidos da Agência; Letty (Michelle Rodriguez) presa em uma base secreta e tendo de conviver com Cipher (Charlize Theron) para sobreviver; e por fim, Jakob (John Cena) sendo enviado por Dom para proteger seu filho, o pequeno Brian (Leo Abelo Perry). Nisso, acaba se surgindo uma bagunça sem tamanho, cujo o arco de Dom se torna o mais destacado, enquanto o dos outros membros da Família acaba tendo a impressão de ser desimportante para o resto da trama, deixando a interação entre eles avulsa, e em ser avulso, a da Letty dá aula, porque chega a ser inacreditável o quanto essas mulheres foram esquecidas. Já o de Jakob com o Little B funciona muito bem, sendo a interação cômica e besta que precisávamos para quebrar o drama desnecessário em outras vertentes. No entanto, o principal destaque não é destacado em nenhum desses arcos, mas inferniza os personagens em todos eles: o Aquaman.

Jason Momoa acaba sendo o grande destaque, pois ele entende perfeitamente que isso é uma piada em formato de franquia. O retcon que fazem para com que ele se encaixe na trama como prólogo é, surpreendentemente, bem editado e conseguem mesclar as cenas novas com as cenas do Operação Rio de maneira na qual parece que ele realmente sempre esteve lá. Momoa faz um personagem essencialmente insuportável, um cara que é irritante, provocador, que passa a mão em mulher quando quer, que parece um usuário áspero do Twitter, trazendo quase que um lado meio "bissexual" na franquia com mais testosterona e medição de pau que existe, por isso que funciona tão bem, ele zoa com a série a esse ponto. Não é nem um lado mais puxado para sexualidade, mas sim para a sua "coringuificação", pois os trejeitos e atitudes são basicamente todas copiadas do Coringa, ele serve para irritar o Dom do mesmo jeito que o pudinzinho irrita o Batman. Até quando Dom está se preparando para um racha (finalmente), ele está lá atazanando-o e tentando tirá-lo do sério. Essa coringada se concretiza em uma cena em que ele conversa com soldados mortos com as expressões feitas com durex e no final quando ele está descendo de um prédio e nas escadas simplesmente olha para cima e solta a risada mais maléfica e caricata já proferida.

Entretanto, é a única coisa que acaba prestando no arco de Dom, já que aqui, há o cúmulo do Vin Diesel no papel. Primeiro que a maior parte da participação acontece no Rio de Janeiro, porém a representação do Brasil aqui é muito errônea, e é aí que você pode falar: "ah, mas você nunca falou da representação de outro país" e é aí que eu respondo: "EXATAMENTE, pois o único país que eu vivi é o Brasil". Basicamente, na visão de quem fez esse filme o Brasil se resume a roupas coloridas, todas as mulheres são gostosas que só andam de shortinho curto, briga de gangue é decidida no racha, as músicas mais estouradas são reggaetons em espanhol e todo mundo tem uma arma (essa última está quase certa). Além disso, nem se deram ao trabalho de escalar uma brasileira, pegaram a atriz portuguesa, a Daniela Melchior, que é uma pessoa cativante, no entanto não funcionou como uma br, parecendo que chegou um ponto que ela cagou para a nacionalidade da personagem e começou a atuar como ela mesma. Sem contar que há um cameo da Ludmilla (é isso mesmo que você leu), que contém facilmente a pior linha de diálogo de toda a franquia e um dos momentos de mais vergonha alheia da história do cinema (eu cogitei levantar e ir embora do cinema).

No arco da Família, acaba sendo bem deslocado dos demais. Depois da cena do Rocket League, acabam se perdendo. Eles inventam uma tetra extremamente forçada entre o Tej e o Roman que não faz o mínimo sentido, nem neste filme, tampouco na franquia como um todo. Pô, eles são quase irmãos, ver aquelas cenas entre eles deu uma vergonhinha, aquela parte que eles caem no soco na lojinha do Pete Davidson em Londres é tão ridícula que eu achei que eles estavam encenando para enganar o cara e não tinha nada a ver. A Ramsey só serve para fazer o papel de menina tecnológica mais uma vez, mas dessa vez apenas resumida a isso, tendo zero diálogos fora desta questão, e o Han... Caramba, o Han é meu favorito, mas a impressão que dá é que ressuscitaram ele só por ressuscitar, já que a função dele na trama é a mesma função que eu tenho no Iron Maiden: nenhuma além de escutar. Enquanto a Letty tem algo interessante ali, mas o problema é a falta de tempo, já que suas cenas são jogadas de maneira aleatória na edição, no entanto a interação da Michelle Rodriguez com a Charlize Theron é surpreendentemente muito boa, mais pelo carisma de ambas do que pelo o texto dado, mas ainda é funcional (até o plot twist da última cena, que aí... aí foi difícil de defender).

Mas o John Cena com o moleque, isso aí é incrível, pois durante toda a trama, eles são os mais deslocados dos outros dentro da narrativa, no entanto, é isso que dá uma liberdade que possibilita a diversão, com direito a musiquinha, dancinha e múltiplas piadas, além de umas viajadas bastante engraçadas. O Jakob foi a melhor coisa do longa anterior e uma grande adição à Família, já que Cena é extremamente surtado e causa a sensação galhofa que precisávamos, é por mais partes assim que eu paguei para ver no cinema e infelizmente acabei não recebendo (mas é a vida). Falando em adições, temos mais duas aqui: Tess (Brie Larson), a filha do Mr. Nobody, e Aimes (Alan Ritchson), o novo chefe da Agência. Ela aparece em poucas cenas, o que é um desperdício, já que você tem a Brie Larson, uma vencedora do Oscar, e é resumida a uma mulher de terninho, só. Enquanto ele tem uma função, a dubiedade envolvendo seu personagem e a relação conturbada com o Toretto deixam ele com uma participação positiva, principalmente com a revelação de quem ele verdadeiramente é. Além de que a melhor linha de diálogo do longa vem dele: "essa Família é basicamente uma seita com carros". Os diálogos inclusive, em sua maioria infames, com tentativas de escape através de frases motivacionais do Dom que são espetaculares, mas não no sentido positivo. São tantos incríveis que não dá para citar todos aqui, mas um em específico merece destaque: "se você se deixar levar pelo seu coração, nunca vai se perder", uma frase atemporal que ficará marcada na história do cinema. (Ironia).

Inclusive é tudo muito ruim, feito na maior preguiça, tudo bem que essencialmente não veremos algo verdadeiramente incrível, porém antigamente a história nos colocava em situações em que nos importávamos com aquela galera, só que depois de tantas mortes, ressurreições, explosões e tudo mais, perdeu toda a graça, já não tem mais o que inventar, o impacto some. Tem um dos personagens que acaba se sacrificando em um momento, mas não tem nenhum impacto mais, pois é quase certo que ele volte no próximo filme, como é que se importa com alguém morrendo depois de todo mundo que já foi de base ter voltado após ter sobrevivido milagrosamente. O que acaba salvando é mesmo a ação desenfreada e os efeitos visuais, que são de primeira linha, com algo que é louco, que desafia as leis da realidade, mas que é divertido de assistir, pô, os caras jogando Rocket League no Vaticano com uma bola em chamas, isso é incrível. A cena do racha no Brasil é muito bacana também, dá uma certa nostalgia de ver um racha de verdade rolando na franquia. A batalha final é inventiva, muito engraçada e que traz a sensação de ação galhofada que precisa, pois é algo muito bem feito tecnicamente que no final está apenas quebrando as leis da física e tudo bem, é isso que o povo gosta. Entretanto, se fosse um pouquinho mais coerente narrativamente, ficaria bem melhor.

Por mais incrível que pareça, "Velozes e Furiosos 10" tem seus acertos, contudo, os erros acabaram se sobressaindo para mim. Se você quiser se divertir vendo algo ruim, totalmente incoerente com a realidade e com a própria franquia, talvez funcione, ainda mais sob efeitos de substâncias alucinógenas. Cara, eu fui ver no cinema pela nostalgia, me diverti em várias cenas, me diverti com o Jason Momoa, com a Charlize Theron, com o John Cena e o Little B, ingeri comidas transgênicas de marcas que não estão me pagando para divulgar, foi um tempo legal em alguns momentos, mas é um filme conturbado no qual eu fico me perguntando se o cinema dominado por IA mudaria alguma coisa, isso é genérico ao extremo, que é feito na base da aleatoriedade e do algoritmo. A verdade é que a franquia morreu junto com o Paul Walker, se despediu junto com ele na cena do See You Again no sétimo, já perdeu a graça. Dito isso, estarei lá em 2025 para ver o 11 na primeira sessão.

Nota - 5,5/10

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