Crítica - Stranger Things 4 (4ª Temporada, 2022)

Arrepiante do início ao fim!

🚨 Texto com spoilers 🚨

Depois de anos de espera, finalmente saiu a tão aguardada quarta temporada da maior série da história da Netflix, a temporada que prometeu chegar com o pé na porta e transformar o que era a história de crianças procurando por seu amigo perdido em uma saga épica da televisão. Aqui, buscando mais pela sua áurea no terror, temos a pura essência da série de volta, onde voltamos para toda essa estética do terror oitentista com a ficção científica mais a vibe John Hughes de desenvolver problemas adolescentes de jeito mais maduro e, com isso, gera uma temporada de nível estratosférico, que supera expectativas e praticamente consolida a série como uma das maiores de todos os tempos. Temos momentos empolgantes, divertidos, tristes, temos cenas épicas, heavy metal, críticas sociais importantes, brutalidade e cenas que fazem qualquer fã chorar genuinamente, foi um espetáculo.

De novo há a divisão de arcos, mas dessa vez, no final eles não se unem no final (diretamente). Temos Eleven (Millie Bobby Brown) tentando recuperar seus poderes com ajuda do seu "pai", o Dr. Brenner (Matthew Modine) e do Dr. Owens (Paul Reiser) e com isso, na Califórnia, Will (Noah Schnapp), Mike (Finn Wolfhard), Jonathan (Charlie Heaton) e o novo personagem Argyle (Eduardo Franco) vão atrás dela. Em Hawkins, Dustin (Gaten Matarazzo) precisa ajudar seu novo amigo, Eddie (Joseph Quinn) a provar sua inocência quando é acusado de mexer com rituais satânicos e assassinar pessoas com isso e Max (Sadie Sink) começa a ver coisas relacionadas e ambos contam com a ajuda de Nancy (Natalia Dyer), Robin (Maya Hawke), Steve (Joe Keery) e Erica (Priah Ferguson) para resolver isso, enquanto Lucas (Caleb McLaughlin) tenta se enturmar com a equipe de basquete, mas descobre que o capitão, Jason (Mason Dye), é totalmente perturbado. Enquanto tudo isso acontece, na Rússia, Joyce (Winona Ryder) e Murray (Brett Gelman) vão atrás de Hopper (David Harbour) que está preso. No final, eles tem que enfrentar algo que está relacionado ao passado de todos: Vecna (Jamie Campbell Bower), o vilão que deu origem ao Mundo Invertido. Essa divisão novamente é funcional e ajuda muito na organização da série.

Primeiro de tudo, eu gostaria de parabenizar os Irmãos Duffer e a Netflix por terem feito os episódios com essa duração, porque muitas séries acabam se limitando no tempo de 40-50 minutos, enquanto aqui eles não ligam e resolvem tudo que tinham de resolver, eles estendem o tempo dos episódios e fazem tudo que tinha de ser feito, de ser explorado (pela duração dos episódios, eu tinha é que escrever uma crítica por episódio) e até algumas coisas mais entediantes como a parte da Califórnia acabam sendo úteis e bem exploradas. Essa temporada poderia até ser a melhor da série, mas acho que justamente esse arco da Califórnia que acaba atrapalhando, as partes que focam nele são geralmente as mais desinteressantes, parece que ali reuniram os dois personagens que aparentemente acabou a utilidade na série e mais o Will que, ao invés de estar preso no Mundo Invertido, dessa vez está preso no armário e esse núcleo se estende demais porque tentam fazer algo de roadtrip com eles e aí eles se encontram com a namorada do Dustin e fica meio chato. E o Jonathan, que era o meu personagem favorito do show, aqui vira só um maconheiro aleatório e isso me decepcionou demais, ele que era o anti-herói brabo, o "literalmente eu", o motorista, virou um drogado que só resgata as raízes do Jonathan nos últimos dois episódios. O Mike também tá sem nenhuma importância já, a função dele é ser tipo a Iris de "The Flash" e fazer discurso motivacional para a Eleven vencer as batalhas com o poder do amor. Acho que o melhor para esses personagens seria logo matar ambos, gosto deles, mas já deram o que tinham que dar.

Eu gosto muito de como Vecna é apresentado, desenvolvido e revelado ao longo da série, a cada episódio vemos uma ou outra referência que vai o construindo, vemos evidências e quando chega no sétimo episódio, a revelação de quem é o Vecna, como ele foi criado, nossa, é arrepiante. Primeiro que a origem dele é mostrada num plot twist "4 em 1", pois descobrimos que ele é filho de um cara acusado de matar a família, mas na verdade foi ele mesmo que a matou e depois é mostrado que ele foi a primeira criança do projeto do Brenner e depois mostra que foi a Eleven que criou o Vecna e abriu o primeiro portal para o Mundo Invertido e essa loucura vai acontecendo, seu queixo vai caindo, seu cérebro vai explodindo e é muito bem dirigido, essa cena foi dirigida pelos próprios Duffer e eles fazem aqui o que talvez seja o maior plot twist da série. Vecna é claramente inspirado em Freddy Kruger (inclusive o ator que interpreta seu pai é o próprio ator do Freddy, o Robert Englund), ele ataca pessoas em momentos mentalmente frágeis, ataca por dentro de sua cabeça e ele é ameaçador, o jeito com que ele é desenvolvido ao longo de cada episódio deixa dele mais ameaçador, mais amedrontador. Vecna é um serial killer, ele é retratado como um, apesar de ter feito só três vítimas e cinco ataques, a construção dele, as motivações, a estética de tudo isso, é feita com base em vários vilões dessa época além do Freddy, dá para citar Jason Vorhees, Michael Myers e até um pouco de Dr. Hannibal Lecter (apesar desse ter vindo depois no cinema). É preciso também dar destaque ao ator, o Jamie Campbell Bower, que sempre foi contestado no seu talento para atuação, mas ele manda muito no papel, principalmente na parte onde ele interpreta o 001, que ele passa uma vibe meio psicopata só que passivo e a cena dele revelando tudo para a Eleven e para a Nancy é espetacular, a voz que ele faz... Nossa, é verdadeiramente bom, a performance dele me surpreendeu, principalmente nos três episódios finais.

Inclusive eu citei o Freddy Kruger e é importante reforçar que essa temporada se assume como uma série de terror, a áurea do terror oitentista é notável, desde a construção do vilão fantasioso até a vibe que os personagens apresentam. A sensação da série remete desde os terrores mais brutos, os terrores misturados com ficção científica e até terror psicológico, acho que esse é mais reparável no quarto episódio onde Max é a protagonista e vemos o explorar de sua mente traumatizada, seja pela morte do Billy, o divórcio de sua mãe, seus problemas de relacionamentos e etc. Esse episódio também é facilmente um dos melhores da série, todo esse desenvolvimento da Max a torna uma das grandes personagens da série e a Sadie Sink arrasa demais na atuação, como dizem os estadunidenses: "she killed that!", uma atuação que ela busca a profundidade de sua personagem, explora internamente os sentimentos dela e traz uma das melhores atuações em todas as temporadas. Porém, mesmo com esse desenvolvimento todo, eu creio que o desfecho perfeito dela seria a morte e aqui vai uma crítica construtiva aos Irmãos Duffer: TENHAM CORAGEM DE MATAR ALGUM DOS PROTAGONISTAS, porque já estamos na quarta temporada e literalmente nenhum personagem dos principais foi morto, eles criam personagens novos que cativam para matar no último episódio ao invés de ter culhão de acabar logo com um dos protagonistas. Se chegar no final e todos os protagonistas estiverem vivos, vai deixar a série um pouco covarde e essa fama não é tão legal. Eu tenho certeza que originalmente a Max morria, mas os Duffer cederam aos pedidos do público e colocaram a versão onde ela não morre.

É preciso falar sobre o maior personagem da história da série: Eddie Munson. Eddie ultrapassou o Jonathan como meu personagem favorito da série, porque o Eddie simplesmente é sensacional, desde o jeito dele, os trejeitos desajustados, a forma dele nerd de ser, o metaleiro que ele é enraizado, isso tudo já bastaria para ele ser um dos melhores personagens da série, mas ele é trabalhado de uma maneira durante os episódios que o vai deixando cada vez melhor ao longo da temporada. Eddie é apresentado como um repetente bullyinado que toca guitarra e joga D&D, mas ele bate de frente com os bullys, ele não tem medo de ser quem ele é, ele sempre foi daquele jeito e morreu daquele jeito, mas esse jeito dele acaba sendo prejudicial por seu inimigo, Jason, acabar insinuando para a cidade inteira que ele era líder de um culto satânico e essa parte do refúgio do Eddie é muito interessante, além da crítica social ser espetacular ao conservadorismo com relação aos jogos, mostrando que as pessoas pensam que D&D é do demônio e que só a graça do senhor poderia salvá-los, encaixou perfeitamente na série e é uma crítica pertinente até os dias de hoje. E, mesmo odiado, Eddie Munson morreu como herói para salvar uma cidade que lhe odiava, ele tem um ato heróico e morre se sacrificando (coisa que aquele bosta do Jason jamais faria), isso é até poético de certa forma, ele era o vilão para o povo de Hawkins, mas se não fosse por ele, muitos não estariam vivos. O trabalho do Joseph Quinn também é incrível, o carisma dele é surreal, a interpretação dele é icônica em várias cenas e a temporada não seria 10% do que é se não tivesse o Eddie. Vou além e dizer que Eddie é um dos melhores personagens de ficção já criados para o audiovisual.

O último episódio, bom, a sensação que me passou foi de estar vendo algo como "Senhor dos Anéis: As Duas Torres" (2002), é como assistir o início do final da história e mesmo sendo totalmente épico, cria mais ansiedade ainda por saber que algo mais épico ainda estar por vir. Na minha opinião, esse último episódio é o ápice da série, são duas horas e vinte de episódio que culmina em o que talvez seja o maior audiovisual de 2022. Mesmo que eu reclame da falta de coragem em matar protagonistas, é difícil negar que esse episódio sabe muito bem como brincar com os sentimentos do espectador, todo personagem corre risco de vida a todo momento e você fica tenso naquelas situações que tão ocorrendo. Eu poderia escrever uma crítica só sobre esse último episódio de tanto conteúdo que ele gera para falar. Primeiro que temos o Eddie tocando "Master of Puppets" do Metallica no Mundo Invertido que é uma das melhores cenas da série, o metal estralando, os raios vermelhos caindo na dimensão sombria, a Max tentando escapar do Vecna e o trio tentando invadir a casa do vilão, é uma das cenas mais bem editadas da série e a letra da música faz completo sentido com o vilão. Também tem vários momentos épicos, como a Eleven derrotando o Vecna de novo, o Lucas derrotando o Jason, a Nancy atirando no Vecna, o Eddie lutando contra os demobats, o Hopper matando o demogorgon com uma espada (!), é tanta coisa para falar e infelizmente não dá pois o parágrafo vai ficar gigante, mas uma última coisa a destacar é que poucas cenas na televisão foram tão tristes quando o Dustin entregando a palheta do Eddie para o tio dele e também o reencontro do Hopper com a El.

Você vê que eu tive que acelerar o texto porque, verdadeiramente, é muito conteúdo para falar nessa temporada, não consegui fazer um parágrafo exaltando o Hopper, o arco da Rússia, a dupla Joyce e Murray, não consegui falar sobre o desenvolvimento da Eleven, o bullying norteamericano genérico, não consegui explorar mais a questão do Will, os Duffer forçando uma possível volta de Nancy e Steve, mas agora já foi, né? Esse texto poderia ter até uma parte dois igual a série. "Stranger Things 4" é o caminho para o verdadeiro final épico e mesmo assim é tão épico quanto seria, a sensação ao ver essa temporada é parecida com ver a caminhada de uma grande franquia do cinema, toda sua abordagem remete a isso. Temos alguns personagens muito mais bem desenvolvidos (Steve, Lucas, Max, El), temos novos personagens carismáticos, tem uma vibe incrível que remete aos bons tempos da primeira temporada e as cenas épicas, desde a Eleven derrotando o 001 até o rock. Foi incrível, eu só não dou nota 10 por conta desse negócio da Califórnia e da insinuação forçada de Steve e Nancy, mas de resto eu adorei essa season.

Nota - 9,0/10

Nota por Episódio:
4x1: "Chapter One: The Hellfire Club" - 9,0/10
4x2: "Chapter Two: Vecna's Curse" - 9,5/10
4x3: "Chapter Three: The Monster and The Superhero" - 8,5/10
4x4: "Chapter Four: Dear Billy" - 10/10
4x5: "Chapter Five: The Nina Project" - 9,0/10
4x6: "Chapter Six: The Dive" - 10/10
4x7: "Chapter Seven: The Massacre at Hawkins Lab" - 10/10
4x8: "Chapter Eight: Papa" - 9,5/10
4x9: "Chapter Nine: The Piggyback" - 10/10

FILMES OU SÉRIES RELACIONADOS:
• Stranger Things (2016)
• Stranger Things 2 (2017)
• Stranger Things 3 (2019)

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