Crítica - Tetris (2023)

O filme que causa pesadelos no Cellbit.

Confesso que quando ouvi pela primeira vez que um filme chamado "Tetris" estava a caminho, pensei que seria uma adaptação em animação onde uma das pecinhas do jogo tenta se rebelar contra a programação e buscar liberdade pelos seus iguais. Felizmente, não foi isso que aconteceu (o que me surpreende visto a onda da falta de originalidade em Hollywood), mas sim acompanhamos os bastidores do jogo, como ele foi criado e, principalmente, distribuído ao redor do mundo, já que foi criado na União Soviética nos anos derradeiros da Guerra Fria. Eventualmente tudo mostrado em outra mídia irá ser levado ao cinema, mas nem tudo pode virar um filme, então a forma ideal de trazer o jogo em que não tem nada além da ação do jogador é contar como aquele produto ficou grande. E é bem interessante, é divertido, mas é problemático quando tenta trazer um assunto mais sério à tona.

No longa, Henk Rogers (Taron Egerton), um comerciante da indústria de games nos anos 80, descobre em uma convenção o jogo que dá nome ao filme e se fascina, com isso, decide buscar os direitos para a distribuição e vender para a Nintendo, contudo, terá que quebrar algumas regras para consegui-los, mas nisso ele acaba se envolvendo diretamente com o rígido governo soviético e a KGB. Pela sinopse que eu acabei de apresentar, percebe-se que é mais um daqueles casos de uma história real absurda que vai para as telonas e ganha repercussão pelo o quão irreal parece, me lembrou "Cães de Guerra" (2016), de Todd Phillips, uma história que envolve a tensão do conflito entre personagens ocidentais e o país que os EUA estavam com ranço naquele determinado momento da humanidade, mas principalmente o medo do protagonista em estar envolvido com uma questão tão gigantesca. Acho que esse trabalho em torno do personagem é bem feito, mas a forma como é trabalhada a política em si é bem fraca, desenvolverei melhor isto no próximo parágrafo.

Metade do filme ocorre dentro da URSS, com uma tensão alastrante no ar. Entretanto, achei a retratação política do país muito superficial, principalmente com uma representação física através do personagem Valentin Trifonov (Igor Grazubov), que é apenas mais um russo genérico de qualquer filme americano. Basicamente é aquela retratação clássica do cinema estadunidense, que se você nasceu na Rússia, automaticamente és um ser humano ruim, mas há uma tentativa de amenização por meio de um dos protagonistas, Alexey Pajitnov (Nikita Efremova), justamente o homem por trás de Tetris, e chega a ser engraçado que ele é realmente retratado como uma exceção, como se ele fosse o único russo gente boa do país inteiro, é maquinalmente cômico. Porém, acho que se deixar isso um pouco de lado e focar mais na história de Henk, tem um thriller interessante de se acompanhar, não é algo que mudou ou inovou o gênero, mas é um trabalho legal de direção, uma estética bacaninha e divertido de assistir, tem um valor de entretenimento agradável.

O grande destaque acaba por ir para o Taron Egerton como Henk Rogers, ele é o grande chamariz do longa. O pessoal vai olhar lá no catálogo da AppleTV+ e dizer: "olha, o novo filme com aquele menino do Elton John que fala do joguinho lá de quando eu era criança" e vai assistir (literalmente foi esse meu pensamento olhando para o pôster pela primeira vez). Taron entrega um desempenho cheio de nuances, um homem que está meio cansado de seu emprego vendendo jogos nitidamente desinteressantes e decide mudar sua estratégia de carreira (e até arriscar sua vida) por sua confiança no produto Tetris, a empolgação que ele passa para o papel quando ele descobre e joga o jogo, o fascínio dele é crível, e depois ele vai dando uma enlouquecida a cada reviravolta ocorrida em sua trajetória e isso deixa uma sensação muito bacana no ar, faz com que realmente gostemos de sua performance, que é verdadeiramente a melhor e maior coisa ocorrida aqui.

Há uma agregação na atuação de Egerton com sua relação com Alexey, que é um bromance inesperado, mas comicamente funcional. Sério, eu ri demais com essa amizade improvável deles, é uma relação que beira o amor Romeu e Julieta, um relacionamento proibido entre um americano (na realidade ele é holandês, mas foi criado nos EUA, então essencialmente é americano) e um soviético durante a realidade da Guerra Fria em seus anos finais, isso parece até uma piada, deixado claro ao final do longa quando há uma cena de reencontro entre eles com um diálogo galhofa, o que deixou muito engraçado. Tentaram criticar o casting de Taron como whitewashing, já que ele fala em uma das cenas como "descendente de indonésios", já que o verdadeiro Henk realmente tem essa descendência, e sinceramente eu acho uma polêmica meio desnecessária, já que é só uma descendência, não significa que ele tem que ter várias características daquele povo. Porém se você olhar uma foto do Taron e uma do verdadeiro Rogers... Chega a ser, no mínimo, estranho, e dá a necessariedade para a polêmica.

No final, não tem sobre o que falar de "Tetris", é aquele filme bacaninha de se assistir num domingo de tarde após aquele almocinho delícia. Tem bastante valor de entretenimento, apesar de sua retratação pífia de um lado político e um casting duvidoso que pode ser considerado um whitewashing, mas que pouco importa porque é uma polêmica que pouco repercutiu e o longa em breve já será esquecido. O que mais tem para destacar? Tem um carinha que é igualzinho ao Matthew Broderick nos anos 80, a semelhança é assustadora, e tem também uma montagem bem dinâmica que dá um toque diferenciado. No geral, é isso, divertido e legalzinho de ver.

Nota - 7,0/10

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