Crítica - Missão: Impossível (Mission: Impossible, 1996)

A origem das peripécias do Tom Cruise.

Poucos sabem (pelo menos aqui no Brasil), mas Missão: Impossível não é uma história criada para os cinemas, na realidade, é baseado em uma seriado de televisão dos anos 60 e 70 estrelada por Steven Hill e Peter Graves, que logo depois teve um revival em 1988 com retorno de Graves. Por que eu comecei falando sobre isso? Não só para complementar, como eu sempre tento fazer, mas também para contextualizar que este primeiro longa na realidade é uma sequência desses programas, pois o protagonista deles era o personagem Jim Phelps, e agora você que viu o filme me pergunta: "ué, Jim Phelps? Esse não é o vilão do filme?", sim, exatamente, e esse é o motivo de que muitas pessoas detestaram o filme quando ele lançou, pois é como se fizessem um longa de "Game of Thrones" hoje e a Daenerys fosse a vilã. Mas, pouco importa, o que é realmente importante é que se tornou o pontapé inicial para o que décadas depois seria uma das maiores franquias de ação e espionagem de todo o cinema, liderados por Tom Cruise e nas mãos do grandioso diretor Brian De Palma, o start é sensacional, que é um clássico icônico dos anos 90.

Aqui acompanhamos Ethan Hunt (Tom Cruise), um agente da IMF, cujo é enviado em uma missão por Jim Phelps (Jon Voight) e lá, toda sua equipe acaba indo de comes e bebes, o que faça com que o diretor Eugene Kittridge (Henry Czerny) comece a caçar Hunt com a suspeita de que ele matou seus próprios companheiros. É uma história bem curta, que De Palma trabalha durante menos de uma hora e cinquenta e ele traz uma complexidade, uma trama cheia de reviravoltas, mas de uma forma simples e acessível, cujo qualquer tipo de espectador consegue entender sem ter muitas dificuldades. Há uma divisão claríssima de três atos, o primeiro é a tragédia que ocorre, o segundo é o Hunt fugindo, montando uma equipe e tentando cumprir seus objetivos para se provar inocente, e o terceiro é a grande conclusão que ocorre no trem, que aí vem muitas reviravoltas e momentos incríveis de ação. É uma essência espetacular, é algo que causa uma sensação maravilhosa enquanto assiste, porque é a magnificência, misturada com a vibe noventista clássica do longa, que hoje em dia é uma nostalgia incrível, porque é espetacular, é um clássico extremamente memorável, e o que vem depois no futuro distante deixa ainda melhor.

O De Palma é um cara que sabe muito bem fazer esses filmes de ação, ele consegue equilibrar muito bem a tensão, o drama, a ação e a espionagem. Começa muito bem apresentando Ethan, suas habilidades e como ele é um grande agente, um mestre do disfarce e coisa e tal, mostrando como ele é o brabo, o pauzudo, até porque é o Tom Cruise e como eu descrevi ele aqui, é o eterno galã de Hollywood. Nesse primeiro ato, já há uma decisão corajosa, já que contrataram atores famosos, como o Emilio Estevez, a Kristin Scott Thomas, o Jon Voight e outros, colocaram eles numa equipe de espionagem e os matam com trinta minutos. Logo após, há o segundo ato que cria o grande conflito do Hunt, a sua fuga e a busca pelas provas de inocência, se envolvendo com toda aquela história do Job e o macguffin da lista NOC, e logo depois formando sua própria equipe. Nisso, Brian demonstra sua maestria ao saber exatamente como colocar essa parte de infiltração, de vigilância, tanto nessa cena inicial de Praga, quanto na invasão à CIA no segundo ato, que é uma das cenas mais icônicas do cinema, com o Tom Cruise caindo na cordinha sendo um dos momentos mais replicados do audiovisual desde então, e isso não vem por acaso, a direção nessa sequência é magistral, é um trabalho de gênio, que deixa o espectador na ponta da cadeira observando.

O terceiro ato então é o cúmulo disso tudo, a espionagem, a ação e os plot twists que a trama apresenta até então, com um encerramento espetacular. Primeiro há a volta do Jim Phelps, cujo o Hunt percebe que ele era o verdadeiro agente infiltrado o tempo todo, logo depois há a grande sequência do trem, que é uma tensão acontecendo o tempo todo, mas que se encerra com outra cena icônica, com a hélice do helicóptero parando exatamente na frente do pescoço de Hunt após ele se salvar e derrotar Phelps e sua conspiração. Poucos sabem, mas esse filme foi indicado ao Framboesa de Ouro na categoria "Pior Roteiro de um Filme com mais de U$100 milhões de bilheteria", primeiro que o maior problema na realidade é a existência de uma categoria assim, segundo que o Framboesa é irrelevante e só busca atenção nessas indicações polêmicas (nesta mesma edição mesmo o vencedor de ator coadjuvante foi o Marlon Brando), terceiro que o roteiro realmente não é complexo, nem extremamente profundo, porém eu já estou fardo de dizer a mesma coisa de que não importa como a história é escrita, mas sim como ela é contada, e como De Palma a conta é brilhante, na minha visão. As ideias de direção, a estética e a ação é verdadeiramente intrigante, que combina demais com a proposta e traz essa sensação incrível ao assistir, cujo é muito ajudado por algumas questões técnicas.

A parte técnica do longa é espetacular, não envelheceu um segundo desde seu lançamento, que vai dos efeitos especiais até a trilha sonora. O trabalho de efeitos visuais é muito bom, utilizando muito da parte prática para demonstrar muita coisa, desde os mais simples como as explosões, até os mais complicados para a época, como no final com o trem e o helicóptero, que é impressionante até hoje. O trabalho sonoro é complicado, é sútil, que consegue pôr a tensão quando necessário aumentando o som de algumas coisas simples, como uma cordinha ou um passo, só para causar essa angústia, esse nervosismo no espectador. Mas o grande destaque técnico é a montagem, que é maravilhosa, que consegue trazer exatamente essa sensação de aflição no espectador, isso que eu falei no som, o aumento de pequenas coisas para causar essa percepção de que qualquer erro mínimo pode dar alguma porcaria. E a trilha é fenomenal, o tema principal fazendo uma remasterização do tema da série e deixando mais pop, com aquele tecladinho e o baixo que é marcante, nas primeiras notas você já reconhece. Não só a trilha principal, como toda a OST, composta pelo grandioso Danny Elfman, que é presente ao decorrer de todo o longa, dando um tom dramático quando precisa, depois aumentando o volume na parte da ação, da espionagem, e nisso temos uma das trilhas mais legais dos anos 90 na minha opinião.

É lógico que não podemos sair daqui sem falar do Tom Cruise, já que o cara é basicamente o dono da franquia, é o rosto que você se lembra quando o nome dos filmes é citado, ele é o Ethan Hunt. A jornada de Ethan é interessantíssima, de um ponto de vista dramático, De Palma desenvolve-o com uma abordagem bem legal, que não é extremamente profunda, mas dentro daquela trama faz com que você se importe com ele, que torça para ele conseguir seus objetivos, o que é complementado pelo talento e carisma do Tom Cruise, que entrega bem no que é pedido. Dramaticamente, ele faz uma atuação bem interessante, que tem todo o trauma dele que ocorre, ele consegue passar a tensão que ele sente de uma forma muito crível, você torce por aquele cara e termina querendo ver mais dele. Outro personagem muito bom, e que se mantém na franquia até hoje, é Luther Stickell (Ving Rhames), que é um hacker extremamente carismático, ele é o exemplo de um bom coadjuvante, pois ele agrega à trama, traz um tom de leveza, é engraçado e tem ações sensacionais que façam que você cria um apreço por aquele cara, porque ele é sensacional e combina perfeitamente com a proposta do longa, não à toa é o único que volta em todos os filmes junto do Tom Cruise. A única coisa que eu não curto é no elenco, é a Claire (Emmanuelle Béart), que é meio dúbia ali, sinceramente, ela só está ali para ser bonitinha, ter uma tensão sexual com o Tom Cruise e fazer caras e bocas para a tela com aqueles olhos azuis gigantes, não passando de uma mulher bonita genérica.

Um clássico dos anos 90, o primeiro "Missão: Impossível" é o início das peripécias do Tom Cruise, o toque inicial numa franquia que viria a fazer sucesso bem depois, mas que já se sustentaria pelo nome só com este filme. A direção do Brian De Palma é cheia de estilo, recheada de tensão e traz uma essência de blockbuster noventista que é perfeita, que traz toda a ação incrível, momentos icônicos, o início de uma revolução dentro do subgênero de espionagem no cinema, que viria a acabar com essa tendência desses longas serem todos caras elegantes de terno resolvendo problemas com russos. Tom Cruise no início de sua transição do cinema "cult" para se tornar um dos grandes astros de ação de todos os tempos, ele hoje em dia é, comprovado por estudos, o ator que mais chama público para irem ver seus filmes no cinema, e tudo tem um passo maior aqui (começou antes, mas aqui é a tentativa de consolidação). É surpreendente, icônico e eu adoro de verdade, consigo ver várias vezes sem cansar.

Nota - 10/10

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