Crítica - Missão: Impossível - Protocolo Fantasma (Mission: Impossible - Ghost Protocol, 2011)
A reinvenção da franquia Missão Impossível.
Após três filmes extremamente bem sucedidos (dois deles, pelo menos), chegamos a um grande ponto de virada dentro da franquia, cujo a vibe sai de algo que o foco é uma ação divertida e meio extrapolada trabalhada calmamente, um negócio que vai e vai para algo mais "pé no chão", com uma abordagem onde a estética fica acelerada, vira algo frenético e que trabalha situações que seriam absurdas na vida real, a nível mundial, de uma maneira mais pé no chão de um jeito tão impressionante que você realmente crê nisso tudo. Esse filme foi um sucesso estrondoso de crítica, público, bilheteria, é um dos mais adorados de toda a franquia até hoje, que acerta em praticamente tudo que os dois anteriores erraram, e trazendo essa nova visão sobre a franquia, saindo de missões que envolviam apenas Ethan Hunt e sua equipe de cada filme resolvendo casos que eram mais "implícitos", mais escondidos de tudo (apesar de um dos vilões ter quase causado uma pandemia), para agora ter que escalonar e evitar uma guerra nuclear entre os Estados Unidos e a Rússia, e agora também temos o verdadeiro início do que eu gosto de chamar de: As Peripécias do Tom Cruise, onde o cara inventa algo absurdo cujo ele corre um risco de vida altíssimo, recusa dublês e vai lá fazer na marra, o que sempre aumenta a expectativa do público para o próximo filme até hoje.
Após fugir de uma prisão russa, Ethan Hunt (Tom Cruise) e sua equipe de IMF tentam se infiltrar no Kremlin, em Moscou, para conseguir informações sobre um homem com o título de Cobalto, que logo é revelado sendo Kurt Hendricks (Michael Nyqvist), e este mesmo homem causa uma explosão no local, fazendo com que Hunt seja apreendido e culpado pelo atentado. Nisso, surge uma história louca que envolve Ethan andando na parte externa de um arranha-céu em Dubai e mísseis nucleares sendo enviados em direção aos EUA, em algo que vai ficando cada vez mais legal e imersivo a cada segundo. Na direção, inusitadamente, temos Brad Bird, que é conhecido como diretor de animações, tendo dirigido o cult queridinho "O Gigante de Ferro" (1999) e posteriormente os clássicos da Pixar "Os Incríveis" (2004) e "Ratatouille" (2007), que dispensam apresentações. Bird então sai de sua zona de conforto e se aventura em uma trama de ação e espionagem que ele fez semelhante lá atrás com sua família de super-heróis, entretanto agora usando de uma seriedade crível em algo que é tão absurdo que você começa a crer no absurdismo, é caprichado, é bem feito, tem uma desenvoltura dramática ali que é trabalhada com maestria, é diferente do "Missão: Impossível 2" (2000), por exemplo, que eles fizeram um absurdo tão inacreditável que soava mais para o lado ridículo da coisa.
Além do tom (não o Cruise, o clima, a vibe do filme mesmo), Brad Bird também se destaca pela sua agilidade, onde ele faz uma trama que é bem trabalhada, mas em um ritmo intenso que mal tem pausas para respirar, tudo vai acontecendo e sempre em um frenesi absurdo. Nisso, criam-se ótimas situações de espionagem, que geram excelentes cenas de ação e mesmo em uma velocidade acelerada, a trama ainda é boa e muito coesa no que se propõe. Bird usa essa estética em uma coisa que, na época, parecia apenas uma tentativa de evolução em uma franquia financeiramente estabelecida após o sucesso do terceiro, mas hoje, percebemos que não era só evolução, era revolução (dentro da franquia), já que os frutos vindouros seguem essa mesma vibe e nisso temos o que estabelece de vez a série, não só uma das mais famosas e bem sucedidas, mas também uma das melhores de ação e de todo o cinema hollywoodiano no geral. É impressionante como a direção, somada à edição, à coreografia e ao trabalho de dublês criam cenas de infiltração e de pancadaria marcantes, cujo Brad e o grandíssimo editor Paul Hirsch são os grandes responsáveis pelo suspense constante na cena, que é o principal para a imersão que se cria, você fica tão preso naquela história que o tempo passa rápido.
No drama, Bird estabelece um mistério sobre o que houve com Hunt no meio tempo entre o terceiro e o quarto capítulo, e ele cria uma narrativa de que sua esposa, Julia (Michelle Monaghan), morreu, e que ele ficou maluco, assassinou seis caras sérvios e por isso estava preso na Rússia. Idas e vindas da história, vamos descobrindo cada vez mais detalhes sobre o acontecido, que vão dessas informações das mortes causadas por Ethan até o envolvimento de alguém de sua equipe na ocasião. O desenvolvimento do protagonista é um bom destaque a se fazer, já que há toda a questão da dubiedade dele, dos acontecimentos off-screen e como se desenrola, é tudo tão sútil. O Tom Cruise entrega, na minha opinião, o que é a melhor performance dele na franquia, dando esse lado ambíguo ao personagem, deixando ele meio misterioso, mas ainda sendo o espião bad-ass, um grande herói de ação, que a cada atitude dele, cada pancada, cada plot twist que ocorre, você dá uma risadinha e diz "esse cara é fod@!". Ele é aquele personagem que vai crescendo e ficando cada vez mais legal, criando e aprimorando seus conceitos, encontrando suas motivações, é maravilhoso ver o crescimento de um personagem que você curte tanto e como sua preocupação com ele vai aumentando com o tempo.
Uma das minhas reclamações sobre o anterior era que a equipe do Hunt era fraca, extremamente sem sal, o contrário do que ocorre aqui, já que temos o protótipo do que viria a ser quase uma equipe fixa. Mesmo sem Luther (Ving Rhames) num papel de destaque, aparecendo apenas rapidamente no final, temos um time que rouba a cena, com o retorno do Benji (Simon Pegg), que como já havia se destacado no terceiro com duas cenas, retorna em um papel maior cujo ele demonstra um carisma incrível e um timing excelente, tanto na comédia quanto na hora da espionagem. Jane Carter (Paula Patton) é a melhor figura feminina da franquia até então, já que ela entrega o lado bad-ass que lhe é pedido com maestria, traz um sentimento fortíssimo de femme fatale, já que ela é forte, habilidosa e sensual no mesmo nível, só peca um pouco na química com o Tom Cruise, mas não é um problema forte. A equipe é complementada por William Brandt (Jeremy Renner), na época que o Jeremy Renner era escalado para tudo o que é franquia, ele aqui faz um personagem secundário, que tem seu desenvolvimento, tem um trauma intrinsicamente ligado ao Ethan Hunt e como ele precisa superar essas adversidades, esse medo que ele tem de errar novamente, é muito bem mostrado, com uma atuação fenomenal do Renner que consegue passar esse sentimento de forma extremamente competente, agregando bastante à parte dramática e dando uma dinâmica interessante à ação.
Retornando à parte técnica, pois sinto que preciso detalhar mais. É uma aula de timing, tudo acontece na hora que precisa acontecer, é de uma precisão impressionante, pois ajuda nessa construção da tensão e faz com que tudo pareça crível, especialmente quando mesclada com a trilha sonora do Michael Giacchino, que é exata em suas colocações, com o tema principal sendo usado de base em vários pontos e traz o suspense necessitado em sua imersão, uma trilha que se infiltra dentro das cenas, parece intrínseca dentro da trama, é incrível. Além das cenas de ação maravilhosas, não só as de espionagem, mas as de lutas e tiroteios e explosão, é tudo bem executado, há uma maestria gigantesca no que se faz, com um trabalho incrível de coordenação de dublês e coreografia de lutas, já que a credibilidade que traz é maravilhosa, ainda mais com a colaboração do Tom Cruise em fazer suas próprias cenas de ação e se arriscando em maluquices, fazendo uma grande transição para a realização de momentos quase impossíveis (sem trocadilho) como aqui ele fica de fora do Burj Khalifa como se não fosse nada, ele estava lá de verdade, vejam os bastidores dessa cena que tem no YouTube, é algo inacreditável, mas sensacional (e depois vai só escalonando nos próximos).
Um dos melhores da franquia, "Missão: Impossível - Protocolo Fantasma" tem tudo que era preciso para alavancar a série de vez no cinema, dando origem à uma fase impressionante de sucesso que vai ficando cada vez melhor. A transição da franquia é bem feita, mesmo mantendo a vibe do original, tem um sentimento único, de algo ainda mais grandioso e que vai mudar daqui para a frente. Brad Bird é um grande responsável por isso, saindo da sua zona de conforto e fazendo um trabalho extremamente competente, mas, sempre bom falar que Christopher McQuarrie, que viria a ser diretor de todos os filmes posteriores, fez a revisão do roteiro sem ser creditado, então já havia um dedo do homem que viria a mudar M:I para sempre. Tom Cruise incrível dramaticamente e fazendo suas loucuras sem dublê, uma equipe extremamente carismática e um baita filme de ação e espionagem marcante, sem sombra de dúvidas é, no mínimo, um dos três melhores da franquia.
Nota - 9,5/10