Crítica - Boyhood - Da Infância à Juventude (Boyhood, 2014)

O filme mais importante da minha vida.

Esse filme é muito importante para a minha vida, porque quando eu tava começando a aprender mais sobre cinema, esse foi um dos primeiros filmes que eu vi, fiquei fascinado com o fato do filme ter sido gravado por doze anos (acho que igual a maioria das pessoas que conhece o filme) e decidi assistir, demorei para encontrar, mas encontrei e até hoje não me arrependo, foi no longínquo ano de 2017 e foi um filme certo na hora certa para mim, eu sinto que esse filme foi feito para mim, porque minha história é muito parecida com a do Mason (Ellar Coltrane) e foi esse filme que me ajudou a perceber que o cinema é e sempre vai ser minha paixão, se não fosse por esse filme, não existiria a página, nem o blog, nem as premiações, talvez nem a mesma pessoa que eu sou hoje eu seria, então, podem falar o que quiser desse filme, não importa, eu o amo com todas as forças e se você não gosta, eu não gosto de você, simples.

O diretor é Richard Linklater, ele gosta de trabalhar com o tempo em suas produções e acho que aqui é mais do que claro que ele trabalha com o tempo, são doze anos gravando o mesmo filme, é um baita de um projeto e já veio um monte de gente me falar que eu só gosto do filme porque demorou doze anos para ser feito, o que é besteira, o fato dele ter sido gravado em doze anos é só um pequeno detalhe comparado ao que ele representa e eu poderia até falar do filme sem dizer que ele foi gravado em um período de tempo enorme, porém é a mesma coisa de fazer um filme do Homem-Aranha sem o Peter Parker, não dá para separarar uma coisa da outra, tá enraizado no filme e não dá para mudar. O fato do filme ser gravado nesses doze anos só demonstra uma competência absurda do Linklater, porque o cara fez o mesmo filme por anos e parece que ele dirigiu sempre com a mesma competência, sempre com a mesma liberdade e sempre tentando ao máximo fazer um retrato da vida real e só longo do filme é perceptível um amadurecimento não só dos personagens como do próprio Linklater como diretor, os últimos três anos do filme já tem uma retratação mais madura do que os anos iniciais do filme, por exemplo. Falando do extra-filme, é um baita projeto, com um planejamento sensacional, os caras tinham mais preparo que o Batman caso algo não saísse como planejado (tinha até planos do Ethan Hawke dirigir o filme caso o Linklater morresse durante a produção), mas no final felizmente deu tudo certo para todo mundo, além do filme ter um roteiro escrito de ano em ano com a atualização da situação mundial que afeta diretamente nos personagens e também alguns problemas de produção (principalmente envolvendo a Lorelai Linklater e sua crise de adolescência pedindo para matar a Samantha - chata do cacete), então foi um projeto bastante arriscado, um dos mais arriscados da história do cinema e que bom que deu certo.

Preciso aqui de início destacar o quanto o filme realmente parece com a vida real, principalmente na questão das pessoas que Mason conhece durante sua jornada e só mostra o quanto as pessoas na vida são passageiras, em todos os anos sempre tem um ou dois personagens que agregam na vida de Mason, tem os meio-irmãos e o estrupício do padrasto dele que, depois do divórcio, somem do filme e faz total sentido, porque eu já ouvi histórias que isso realmente acontece e eu também já ouvi várias histórias sobre relacionamento abusivo e principalmente envolvendo casamento com filhos e o padrasto do Mason é a escória da humanidade, até quem não gosta do filme tem vontade de dar uma bica nele, e depois no filme vão surgindo amigos do Mason que ele vai perdendo ao longo do tempo, como aquela menina da bicicleta, ele provavelmente nunca mais viu ela. E tem duas situações do filme que eu gostaria de destacar: a primeira é o Mason sofrendo bullying por nada, que acontece em todas as escolas, tem gente bullyinada por nada e achei legal do filme retratar isso e também tem a situação do encanador que é ajudado pela mãe do Mason (Patricia Arquette) e a gente vê que ela mudou a vida dele com uma simples fala e isso realmente acontece, você, com uma frase, pode mudar a vida de uma pessoa para sempre e a cena no final é linda!

Eu gosto mais de como as relações familiares do Mason são estabelecidas, a relação com a irmã dele é muito boa, é aquela clássica relação fraterna que os dois provocam, brigam, falam que se odeiam, mas no fundo se amam, uma relação com seus irmãos vai ser sempre assim, uma relação de amor disfarçada de relação de ódio e a Lorelai Linklater não é uma atriz ruim, mas ela é muito abaixo dos outros componentes do elenco principal e acho que por isso tem gente que desgosta da performance dela, mas acho que em cada fase dela ela se sai bem, até porque ela deve estar interpretando ela mesma, indo da criança irritante para a adolescente desanimada, então acho que ela vai bem para quem não era nem para estar no filme (é sério, o Mason era filho único na versão original, só botaram no filme porque o Linklater levou ela para o set e ela não parava de encher o saco, aí improvisaram ela no filme, tanto que na aparência ela não tem nada parecido com nenhum dos outros componentes da família).

A relação do Mason com o pai (Ethan Hawke) é maravilhosa, esse arquétipo do pai divertidão, jovem, excêntrico, ele é aquele tipo de pai que não quer ser apenas um pai para seus filhos, ele também quer ser um amigo para eles, passar conhecimentos sobre as coisas que ele gosta para eles, aquela cena dele no estádio de beisebol explicando para eles o jogo, como funciona e passando a paixão pelo time para eles, aquilo é muito coisa de pai, tem também depois a cena com ele falando sobre Beatles com o Mason Jr. e é maravilhoso ele falando como se estivesse falando com um parça dele, ele falando sobre a sinfonia dos Beatles separados, é muito legal ver aquilo. Também é muito legal ver o amadurecimento dele durante a trama, porque ele começa sendo irresponsável, um músico sonhador, ele pouco vê os filhos e logo mais ele estava casado com uma relação saudável, com mais um filho, sendo realmente um pai melhor, é até legal ver essa evolução dele porque realmente tem gente que só amadurece depois de encontrar a felicidade em outras coisas na vida. E o Ethan Hawke é espetacular, ele só não ganhou um Oscar por esse filme porque ele concorreu com o J. K. Simmons imbatível em "Whiplash - Em Busca da Perfeição", mas eu acho ele no mesmo nível, é uma atuação sensacional por todos esses motivos citados acima e como ele consegue mostrar essa personalidade e seu amadurecimento na trama de forma magistral, a última cena dele no bar é uma cena emocionante e muito paterna.

E, claro, a relação com a mãe, a Patricia Arquette é a grande força do filme, muita gente diz que ela é a protagonista, que a história é sobre ela e sobre o sacrifício de uma mãe por seus filhos, eu discordo dessa interpretação porque eu acho que o foco do filme é mostrar a vida de um menino mesmo, mas é uma interpretação bastante válida, realmente tem essa questão de abordar o sacrifício materno, mas é algo que eu considero secundário na trama, eu acho essa parte muito boa, porque a Liv é batalhadora, ela é uma mulher forte, ela vai atrás do que quer, mas sempre priorizando os filhos acima dela, ela me lembra da minha própria mãe. O desenvolvimento dela é outro muito bacana de acompanhar durante o filme, ela sai de uma mãe solteira que mal tem tempo para ela mesma e se torna uma baita professora, além de mostrar todos os abusos e situações difíceis que ela enfrentou ao longo da trama, como ser agredida pelo marido e se casar duas vezes com caras babacas. Enquanto a atuação da Patricia Arquette, é a atuação de uma carreira! Sério, é uma das minhas atuações favoritas da história, o desabafo final dela é um dos melhores monólogos que eu já vi, ali ela mostra toda dor de uma mãe ao perder tudo, quando ela vê que seu filho vai embora, ela sente ali que a vida dela está chegando ao fim e é emocionante, é arrepiante.

Falando agora do próprio Mason, eu acho incrível que a imersão no filme é tão grande que ao final da trama, ao ver o Mason se formando, os espectadores sentem orgulho dele, você sente orgulho de um personagem fictício, em duas horas e meia você se apegou tanto àquele personagem que quando você vê ele conquistando um grande objetivo na vida é até emocionante (já fiquei mais feliz pelo Mason do que por gente que eu conheço). Sabe, eu me identifico muito com ele, como eu disse eu tive momentos parecidos com o que ele teve no filme e acaba por mexer muito comigo e eu acho legal ver esse crescimento dele, você vê ele indo de uma criança inocente, para um pré-adolescente bradando a vida, para um adolescente emo que fuma e bebe e, finalmente, para um calouro da faculdade, essa ideia de acompanhar o crescimento do personagem parece algo tão idiota, mas no final é tão bom, tão confortável, parece uma ideia genial. Ellar Coltrane é um bom ator, eu acho que ele manda muito bem, apesar de ter momentos de inconsistência, acho que mais na parte onde ele tem quinze e dezesseis anos, mas acho que ele convence muito em todas as partes, desde criança (talvez a melhor fase dele na atuação) até ele adulto.

Depois dessa quantidade imensa de caracteres, acho que já deu para perceber o quanto eu amo "Boyhood - Da Infância à Juventude", é o filme que me fez amar o cinema, é o filme que deu rumo para a minha vida, sem ele, eu seria uma pessoa totalmente diferente da que eu tenho orgulho de ser. O filme é imersivo, é impactante, é de fácil identificação, tem bons personagens e é um filme muito confortável, traz uma vibe inexplicável. Acima de tudo, é um filme sobre a vida, sobre como as coisas surgem e acabam, sobre como as coisas vem e vão, sobre mudanças, sobre amadurecimento, sobre evolução pessoal, sobre família e seu valor, sobre como a vida pode ser maravilhosa. Esse filme só tem um problema: ele acaba, porque eu poderia ver ele pelo resto da minha vida sem cansar nenhum pouco, eu amo muito esse filme!

Nota - 10/10

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