Crítica - Faça a Coisa Certa (Do The Right Thing, 1989)

Ainda é um filme muito atual... Infelizmente.

O primeiro grande filme de Spike Lee, provavelmente o mais adorado entre todos eles. Spike Lee é um diretor negro que em 90% de sua filmografia abordou temas como racismo, preconceito, lutas por direitos raciais, temas políticos, direitos humanos e outros assuntos relevantes para as causas cujo o realizador verdadeiramente luta na vida real. Neste clássico, Spike aborda mais do que apenas o racismo, trabalha com todos os tipos de preconceito e isso nos mostra tristemente que o preconceito é enraizado em todos nós, em uma cena de mais ou menos dois minutos, Spike retrata racismo, xenofobia, homofobia/transfobia e intolerância religiosa numa cajadada só, é triste que este filme ainda não esteja datado, porque é absurdo ver que acontecimentos retratados em 1989 ainda são tão comuns quanto mais de trinta anos depois.

Primeiro que nesse filme não existe nenhuma pessoa boa, são todos babacas, tem gente que é equilibrada entre ser um cara legal e um cara escroto e tem gente que tu tem vontade de dar um murro por ser estúpido o filme inteiro, os únicos personagens que eu acho que são legais o filme inteiro são o Prefeito (Ossie Davis) e o Mister Senor Love Daddy (Samuel L. Jackson), o resto são todos personagens que você tem relação de amor e ódio ou apenas de ódio mesmo, até nosso protagonista, o Mookie (interpretado pelo próprio Spike Lee), parece que ele é legal, mas aí você vê que ele é um malandro que gosta de arranjar desculpas para cabular o trabalho e não vê nem o próprio filho constantemente (e de quebra ainda acha que tem moral para opinar sobre a criação do menino sem nem vê-lo direito, aff pais ausentes), você vai vendo o filme e vai pegando ranço de todo mundo, até personagens que você cria um certo apreço, você pega ranço depois. Nesse filme todo mundo toma atitudes erradas em algum momento, até o Sal (Danny Aiello), que você gosta e desgosta dele ao mesmo tempo.

Spike Lee durante o filme inteiro cria aquele ambiente de vizinhança muito bem, a vizinhança onde todo mundo se conhece, frequenta os mesmos lugares, tem os mesmos hábitos, passam pela mesma coisa, vai mostrando ao longo da trama que naquele bairro todo mundo é uma celebridade e tal e esse clima vai sendo misturado com assuntos sociopolíticos durante toda a exibição (em especial, o racismo, como já disse) e com isso o Spike vai cada vez mais nos guiando para um final caótico, onde tudo começa a dar errado para todo mundo e o final é muito forte, muito pesado, é triste, pois em uma confusão entre brancos e negros, quem a polícia acaba detendo? Quem os policiais acabam injustamente matando só por ser quem é e pelo o que acredita? É verdadeiramente deprimente saber que hoje essa cena faz mais sentido que há 33 anos atrás, hoje é só ligar num jornal que já mostra a violência policial contra negros, por qual motivo? A pele. É completamente inacreditável e inaceitável algo desse tipo ainda ser comum hoje em dia, parece que a humanidade está em retrocesso, está em involução, o filme tem esse final completamente revoltante, onde os negros acabam se ferrando por acreditar no que acreditam e por gostar do que gostam, olha que negócio absurdo! É sério, não dá para entender.

A autoralidade de Spike Lee também é notável, é um dos filmes mais autorais da história de duvidar, com certeza o mais autoral de seu diretor, com planos fechados na cara dos personagens, como se fosse a visão do outro personagem cujo está dialogando, cenas com pequenos monólogos onde os personagens acabam por expressar seus sentimentos, é um filme com uma identidade muito única, é um filme que se diferencia dos demais, com certeza é um filme muito especial. O Spike Lee também manda bem na direção de atores, tem alguns que eu gostaria de destacar. O Giancarlo Esposito como Buggin Out é incrível, ele convence muito no papel do cara que acredita veementemente em suas crenças sociopolíticas e tem cenas onde ele sai de si completamente ficando maluco e é incrível. O John Turturro tem uma das melhores atuações da carreira dele, é um personagem que você tem antipatia por ele o filme inteiro, a vontade de metê-lo a porrada é gigante, ele é um racistinha de bosta que se sente superior por ser branco e o John Turturro é incrívelmente carismático na vida real, todos os outros papéis dele são em personagens com carisma, o personagem dele aqui não tem carisma, é um completo idiota que você odeia desde o início e isso só prova o quanto a atuação é boa, um cara de boa e carismático ir para um personagem mimado, nojento e antipático é algo de mestre. E também o Danny Aiello, acredito que seja o destaque principal de atuação para todo mundo que viu o filme, ele muda de semblante o tempo todo, faz você gostar e desgostar dele de uma hora para a outra, convence ao demonstrar suas convicções e crenças em relação ao bairro e às suas origens, acho ele também muito expressivos e com essa vantagem, ele transpassa perfeitamente todas as emoções do Sal, uma grandiosa atuação.

Um clássico, "Faça a Coisa Certa" é um filme de mais de trinta anos atrás que é infelizmente atual, que fala sobre assuntos pertinentes nos dias de hoje, um filme que fala sobre preconceito e que mostra como todos nós somos pessoas horríveis e que o preconceito está enraizado na humanidade. Além de uma assinatura clara do Spike Lee e um elenco perfeito, o filme é corajoso, poderoso, original, chocante, único, especial e inesquecível, que filme maravilhoso!

Nota - 10/10

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